O Retrato de Dorian Gray - Cap. 17: Capítulo 17 Pág. 281 / 335

Então passaram por solitárias tijolarias. O nevoeiro era aí mais ténue, permitindo-lhe ver os estranhos fornos em forma de garrafa, de que irrompiam línguas de fogo como enormes leques amarelos. Um cão ladrou à sua passagem, e ao longe, nas trevas, gritou uma gaivota errante. O cavalo tropeçou numa cova, desviou-se e deitou a galope:

Passado algum tempo, deixaram a estrada e meteram por ruas toscamente calcetadas. A maior parte das janelas estavam às escuras, mas, de longe a longe, projectavam-se fantásticas sombras sobre as cortinas iluminadas. Pôs-se a examiná-las com curiosidade. Moviam-se como monstruosos títeres e gesticulavam como seres vivos. Odiava-as. Lavrava-lhe no coração uma raiva surda. Ao virar duma esquina, uma mulher bradou-lhes qualquer coisa duma porta aberta e dois homens correram umas cem jardas atrás do carro. O cocheiro fustigou-os com o chicote.

Diz-se que sob o império da paixão os nossos pensamentos descrevem um círculo. Com uma horrenda reiteração, os lábios mordidos de Dorian Gray proferiam e tornavam a proferir aquelas subtis palavras sobre a alma e os sentidos, até nelas encontrar, por assim dizer, a plena expressão do seu modo de ser e justificar, pela aprovação da inteligência, as paixões que sem justificação haveriam ainda dominado o seu temperamento.





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