A República - Cap. 5: Capítulo 5 Pág. 135 / 290

- Queres então que peçamos ao nosso opositor que nos acompanhe, enquanto tentamos demonstrar-lhe que não há nenhum emprego exclusivamente próprio da mulher no que respeita à administração da cidade?

- Com certeza.

- Nesse caso, dir-lhe-emos, responde a isto: quando pretendes que um homem é bem dotado para uma coisa e outro mal dotado, queres dizer que o primeiro a aprende facilmente e o segundo com dificuldade? Que um, após um breve estudo, leva as suas descobertas muito além do que aprendeu, ao passo que o outro, com muito estudo e aplicação, nem sequer salva o saber recebido? Que no primeiro as disposições do corpo favorecem o espírito e no segundo o prejudicam? Há outros sinais além destes que te permitam distinguir o homem dotado para seja o que for daquele que não o é?

- Ninguém pretenderá que haja outros.

- Agora, conheces alguma ocupação humana em que os homens não ultrapassem as mulheres? Prolongaremos o nosso discurso mencionando a tecelagem, a pastelaria e a cozinha, trabalhos que parecem depender das mulheres e em que a inferioridade deles é no mais alto grau ridícula?

- Tens razão - observou - ao afirmares que em tudo, por assim dizer, o sexo forte ultrapassa de longe o outro sexo. Contudo, muitas mulheres são superiores a muitos homens, em muitos trabalhos. Mas geralmente é como dizes.

- Por conseguinte, meu amigo, não há nenhum emprego respeitante à administração da cidade que pertença à mulher enquanto mulher ou ao homem enquanto homem; pelo contrário, as aptidões naturais estão igualmente distribuídas pelos dois sexos e é próprio da natureza que a mulher, assim como o homem, participe em todos os empregos, ainda que em todos seja mais fraca do que o homem.

- Perfeitamente.

- Atribuiremos então todos os empregos aos homens e nenhum às mulheres?

- Como proceder assim?

- Mas há, diremos nós, mulheres que são naturalmente aptas para a medicina ou para a música e outras que não o são.

- Com certeza.

- E não as há que são aptas para os exercícios gímnicos e militares e outras que não gostam nem da guerra nem do ginásio?

- Julgo que sim.

- Ora bem! Não há mulheres que amam e outras que odeiam a sabedoria? Não há algumas que são irascíveis e outras sem ardor?

- Sim, há.

- Portanto, há mulheres que estão aptas para a guarda e outras que não o estão. Ora, não escolhemos homens dessa natureza para fazermos deles os nossos guardas?





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