A República - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 209 / 290

- Sendo assim - prossegui -, acreditas que a dialéctica é de certo modo o remate supremo dos nossos estudos, que não há outro que se lhe sobreponha e, finalmente, que acabámos com as ciências que é preciso aprender.

- Sim - respondeu.

- Resta-te agora determinar a quem comunicaremos estes estudos e de que maneira.

- Evidentemente.

- Lembras-te da primeira selecção que fizemos dos chefes e quais os que elegemos?

- Como não? - disse ele.

- Pois bem! Não esqueças que é preciso escolher homens do mesmo carácter, isto é, que é preciso preferir os mais corajosos e, tanto quanto possível, os mais belos. Além disso, é preciso procurar não só caracteres nobres e fortes, mas também tendências adequadas à educação que lhes queremos dar.

- Determina quais são essas tendências.

- Têm de ter, bem-aventurado amigo, penetração para as ciências e facilidade em aprender; com efeito, a alma aborrece-se mais com os estudos intensos do que com os exercícios ginásticos: o esforço é-lhe mais sensível porque não é senão para ela só e o corpo não o compartilha.

- É verdade - concordou.

- Portanto, é preciso que o homem que procuramos tenha memória, uma constância inquebrantável e o amor a toda a espécie de trabalho. De outro modo, achas que consentiria em impor-se, para além dos trabalhos do corpo, tantos estudos e exercícios?

- Só o consentirá - respondeu - se for felizmente dotado em todos os aspectos.

- O erro que hoje se comete - continuei - e é causa do desprezo que pesa sobre a filosofia deve-se, como dissemos atrás, ao facto de nos entregarmos a este estudo sem sermos dignos dele; com efeito, não deveriam abordá-lo talentos bastardos, mas unicamente talentos autênticos.

- Que queres dizer? - perguntou.

- Em primeiro lugar, aquele que deseja consagrar-se a ele não deve ser coxo no seu amor ao trabalho, isto é, laborioso para metade da tarefa e preguiçoso para a outra, o que é o caso do homem que ama a ginástica, a caça e se entrega com zelo a todos os trabalhos corporais, mas não tem, por outro lado, nenhum gosto pelo estudo, a conversação, a pesquisa e detesta todo o trabalho desta natureza. Também é coxo aquele cujo amor pelo trabalho se situa do lado oposto.

- Nada mais verdadeiro.





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