A República - Cap. 9: Capítulo 9 Pág. 255 / 290

- Assim, dos três prazeres em questão, o desse elemento da alma pelo qual conhecemos é o mais agradável e o homem em quem esse elemento comanda tem a vida mais amena.

- Como poderia ser de outro modo? O louvor do sábio é decisivo; e ele louva a sua própria vida.

- Que vida e que prazer porá o nosso juiz em segundo lugar?

- É evidente que será o prazer do guerreiro e do ambicioso, porque se aproxima mais do seu do que do do homem interesseiro.

- O último lugar caberá, portanto, ao prazer do homem interesseiro, segundo parece.

- Sem dúvida - respondeu.

- Eis, portanto, duas demonstrações que se sucedem, duas vitórias que o justo obtém sobre o injusto. Quanto à terceira, disputada à maneira olímpica em honra de Zeus salvador e olímpico, considera que, à parte o do sábio, o prazer dos outros não é nem bem real nem puro, não é senão uma espécie de esboço sombreado do prazer, como julgo tê-lo ouvido dizer a um sábio; e, realmente, poderia ser para o homem injusto a mais grave e a mais decisiva das derrotas.

- De longe. Mas como o provas?

- Da seguinte maneira, contanto que me respondas enquanto procuro contigo.

- Interroga, então.

- Diz-me - perguntei -, não afirmamos que a dor é o contrário do prazer?

- Afirmamos.

- E não há um estado em que não se sente nem alegria nem pena?

-Há.

- Estado intermédio igualmente afastado desses dois sentimentos, que consiste num repouso em que a alma se encontra relativamente a um e a outro. Não é assim que o entendes?

- Sim - disse ele.

- Ora, lembras-te das palavras que dizem os doentes quando sofrem?

- Que palavras?

- Que não há nada mais agradável do que ter saúde, mas que, antes de estarem doentes, não tinham notado que era a coisa mais agradável.

- Lembro-me disso.

- E não ouves dizer aos que sentem uma dor violenta que não há nada mais agradável do que deixar de sofrer?

- Ouço-o dizer.

- E, em muitas outras circunstâncias semelhantes, notaste, julgo eu, que os homens que sofrem exaltam com a coisa mais agradável não a fruição, mas a cessação da dor e a sensação do repouso.

- É talvez porque então o repouso se torna ameno e agradável.

- E, quando um homem deixa de experimentar um gozo, o repouso relativamente ao prazer é-lhe penoso.

- Talvez - disse ele.

- Assim, este estado, de que dizíamos há instantes que era intermédio entre os outros dois, o repouso, será às vezes um ou outro, prazer ou dor?

- É o que parece.





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