Contos de Mistério - Cap. 8: O ESPELHO DE PRATA
(The silver mirror) Pág. 159 / 167

A mão livre segura uma pequena faca mas treme demasiado e está demasiadamente dobrado para fazer uso dela. Começo a discernir vagamente as personagens do segundo plano. Caras barbudas e cruéis emergem da bruma. Revela-se ali um ser terrível, uma espécie de esqueleto, com faces cavadas e, olhos enterrados nas órbitas. Também ele segura uma faca. A direita da mulher está um homem jovem, alto, de cabelos cor de linho, de rosto duro e sombrio. A mulher e o indivíduo que rasteja próximo dela erguem para ele olhos suplicantes. Parece ser o árbitro da sua sorte. O indivíduo que rasteja acerca-se ainda mais da mulher e agacha-se junto do vestido. O jovem alto, inclinando-se, quer arrancá-lo dali. O espelho tornou-se novamente límpido antes de a visão me ter levado mais longe. Saberei alguma vez o desfecho? E o princípio? Tenho a certeza de não imaginar nada. Este drama foi representado um dia algures, e este velho espelho reflectiu-o. Mas quando? E em que lugar?

20 de Janeiro. A tensão do meu cérebro, a intolerável fadiga que sinto advertem-me de que algo em mim vai ceder. Roço os limites do esgotamento. É preciso que num supremo esforço, esta noite, antes de abandonar a minha cadeira, encerre o derradeiro livro de registos e tire as minhas conclusões. Quero assim! Quero assim!

7 de Fevereiro. Está pronto. Mas que acontecimento, meu Deus! Terei ainda forças para contá-lo?

Escrevo isto na casa de saúde do Dr. Sinclair. As últimas linhas do meu jornal datam de há três semanas. Na noite de 20 de Janeiro, o meu sistema nervoso cedeu de uma só vez. Não tenho lembrança de mais nada até ao minuto em que, há três dias, me encontrei neste lugar de repouso. Aqui posso descansar de consciência tranquila. Os meus algarismos estão nas mãos dos solicitadores.





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