Eneida - Cap. 10: A Assembleia dos Deuses Pág. 193 / 235

Em seguida, gemendo, levantou-se combatido e ordenou que lhe trouxessem o cavalo, corcel valoroso que já o levara a muitas vitórias. Falou então, entristecido, ao animal:

— Rebo, temos vivido muito tempo juntos, como companheiros. Levar-me-ás de volta ao combate e, ou venceremos Eneias, trazendo-lhe os despojos e a cabeça escorrendo sangue, ou morreremos juntos, pois nunca poderias suportar no dorso, como senhor, um príncipe troiano.

Montou, muniu-se de vários dardos, firmou o capacete de plumas na cabeça e avançou a galope pelo meio dos combatentes. No fundo do coração, ferviam-lhe uma vergonha imensa, a insónia misturada com a dor, o valor consciente e o amor agitada pela furta. Três vezes bradou por Eneias, em altas vozes, até que este o ouviu e exclamou, contente:

— Finalmente, o grande Apolo e o pai dos deuses permitem que te apresentes contra mim.

Respondeu-lhe Mezêncio:

— Porque me atemorizas, homem cruel, depois de teres assassinado o meu filho? Era esse o único meio através do qual me conseguirias derrotar. Não tememos a Marte, nem a qualquer dos deuses. Chega de bazófia, pois venho decidido a tudo. Aí vai.

Assim dizendo, lançou o seu poderoso chuço contra o troiano e logo atirou outro e mais outro, enquanto galopava em largos círculos em torno do inimigo. Mas o escudo de bronze de Eneias desviava as armas, pois para isso o fabricara Vulcano, esposo de Vénus e senhor das forjas eternas. Cansado já do combate que se demorava, Eneias adiantou-se e enviou uma tremenda lançada à testa do corajoso ginete. Este empinou-se e caiu, prendendo o cavaleiro sob o seu corpo agonizante. Enorme clamor subiu aos ares, partido de troianos e latinos. Eneias, com a espada desembainhada, correu para Mezêncio caído e disse-lhe:

— Onde estão agora, tirano impetuoso, a tua feroz energia e indómita coragem?





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