O sargento-mor, que também era cavaleiro de Cristo, desde 1812, pensava desde muito casar Tomásia com cavaleiro da mesma ordem. Conhecia-me ele de nome e formava de mim opinião desvantajosa: não assim a rapariga que me tinha visto anos antes, numa festa de Endoenças, e gostara de me ver com a opa verde de irmão das almas, funcionando nas cerimónias da igreja.
A casa do sargento-mor rendia quinhentas medidas de centeio, meia pipa de azeite e vinte carros de castanha; sustentava três juntas de bois e quatro irmãos padres.
O leitor ignora, talvez, a jerarquia de um sargento-mor. Pensa que é uma patente destas que enchem a cobiça do coração de uma costureira ou criada de sala, a quem o sargento oferece sua alma e oito vinténs diários de pré?
O sargento-mor das antigas milícias era um potentado, imediato na jerarquia ao capitão-mor, com quem por igual se repartiam os lombos e os respeitos sociais. O baque da monarquia absoluta, esmagando com os privilégios o acatamento que os privilegiados incutiam, respeitou o sargento-mor de Soutelo. Os povos reverenciavam-no no teor antigo e testemunhavam seu acatamento presenteando-o com os lombos dos cevados, tal e qual como nas ominosas eras em que o sargento e o capitão-mores representavam, no aparelho gástrico do absolutismo, um dos intestinos mais importantes - o recto, se quiserem.
Tomásia era um rapariga desempenada e com olhares derretidos. De entendimento era escura, como quem não sabia ler, nem tivera, alguma hora, desgosto da sua ignorância. Tinha vinte e seis anos e nunca estivera doente. Nunca tomara chá nem café. Almoçava caldo de ovos com talhadas de chouriço. O Sol, ao nascer, nunca a surpreendeu em jejum. Trabalhava de portas adentro com as criadas: fazia as barrelas, fabricava o pão, administrava a salgadeira e vendia os cereais e as castanhas.