Procurar livros:
    Procurar
Procurar livro na nossa biblioteca
 
 
Procurar autor
   
Procura por autor
 
marcador
  • Sem marcador definido
Marcador
 
 
 

Capítulo 4: CAPÍTULO III - A MULHER QUE O MUNDO DESPREZA

Página 59

***

- Conta-me a tua história, Marcolina, antes que eu perca a razão, para lhe dar valor. A embriaguez, quando não é insultuosa, é pouco persistente nos sentimentos generosos. Faz-me compadecer de ti e darás à minha vida rumo novo, ou pelo menos uma ideia útil e própria de homem que ainda tem intervalos de encontrar-se na consciência. Tu choraste, quando viste árvores e flores; pediste- me que te deixasse morrer lá em cima entre as fragatas da serra; erraste uma vista, de quem se sente morrer de desalento, pela extensão do mar. Quem és tu?, donde caíste até encontrar o primeiro apoio na tua queda sobre o ombro de um homem perdido de razão, que tu recebeste como se encontrasses um teu irmão no despejo e na desgraça? Já sei o teu nome; vejo que foste bela; que a natureza te quer ainda vestir de umas galas que tu expeliste de ti, quando as rasgavas com pedaços do coração. Já tens outra cor; e as lágrimas, em que te nadam os olhos, parece que te querem lavar os estigmas da face. Voarão nesta atmosfera os anjos invisíveis que te conheceram, quando tu eras pura?

Marcolina abraçou-me sem a veemência convulsiva que os dramaturgos mandam nas rubricas. Foi um abraço senhoril, comedido e honesto como nossas avós os davam naqueles jogos e saiam sempre numa cadeira em frente da minha otomana e disse:

- Nasci no dia em que o meu pai morreu nas linhas de Lisboa. Tenho dezoito anos. O meu pai foi empregado na tesouraria, onde ganhava para levar a vida com abundância. Se algum desgosto sentia, era por não ter um filho. Morreu, como lhe disse, no dia em que eu nasci.

A minha mãe ficou muito nova e bonita; mas quase pobre. As economias que o meu pai deixara dariam escassamente a subsistência de um ano. Ouvi dizer que a casa estava trastejada com luxo, em que o meu pai se esmerava, por ter sido criado no paço, onde meu avô era cirurgião.

<< Página Anterior

pág. 59 (Capítulo 4)

Página Seguinte >>

Capa do livro Coração, Cabeça e Estômago
Páginas: 156
Página atual: 59

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
PREÂMBULO 1
PRIMEIRA PARTE – CORAÇÃO
CAPÍTULO I - SETE MULHERES
6
CAPÍTULO II - A MULHER QUE O MUNDO RESPEITA 29
CAPÍTULO III - A MULHER QUE O MUNDO DESPREZA 55
SEGUNDA PARTE – CABEÇA
CAPÍTULO I – JORNALISTA
81
CAPÍTULO II - PÁGINAS SÉRIAS DA MINHA VIDA 90
TERCEIRA PARTE – ESTÔMAGO
CAPÍTULO I - DE COMO ME CASEI
123