Numa das minhas primeiras idas a S. Carlos, vi minha irmã num camarote com mais duas senhoras. Dei um grito de surpreendida e indiquei-a ao barão. ‘Não olhes para lá, disse-me ele, ‘tua irmã, se é aquela, deve ser o que são as companheiras: são três prostitutas que ali estão.’ Baixei os olhos, como obrigados pelo peso das lágrimas e da vergonha. Vergonha e lágrimas! Que mais valia eu que a minha irmã, e quem era mais digna de lágrimas que eu!
Um dia recebi um bilhete da minha irmã, dando-me os parabéns da minha felicidade e pedindo-me que a não desprezasse por ter sido menos feliz que eu na carreira que a mãe nos dera a ambas. Mostrei esta carta ao barão, e ele, com soberba irritação exclamou: ‘Não lhe respondas; proíbo-to, sob pena de ficarmos mal.’
- Começa o barão... - atalhei eu.
- Começa o segundo acto da minha tragédia - disse Marcolina.
***
- Fui um dia ao Campo Grande: ia sozinha na carruagem. Apeei para passear entre as árvores e vi ao longe duas senhoras correndo para mim. Conheci minha irmã e corri para ela. Abraçámo-nos a chorar. Contou-me em breves palavras a sua vida. Era a minha, com a diferença das pompas. Vivia com um mercador de panos, que aborrecia; mas sujeitava-se por não ver outro caminho por onde achasse mais honesto modo de vida. Praguejou contra a mãe, analisando ao mesmo tempo os meus anéis e pulseiras com olhos cobiçosos.
Quando assim estávamos entretidas, apareceu de súbito o barão; encarou-me com desabrimento e disse-me: ‘Já para casa!’ Não repliquei, nem mesmo olhei para minha irmã. O barão arguiu-me severamente; e, dizendo-lhe eu que a minha vida não era mais honesta que a da outra desgraçada, mostrou-se muito ofendido com ser comparado ao mercador de panos. Arrependi-me de dizer tal, porque ouvi insultos da sua vaidade ferida com tão pouco.