- Era uma pulseira! - interrompi eu com ambições de graça. - O barão, exceto os dedos, parece-me um bom sujeito!
- Era - disse Marcolina -, era um coração como poucos. As ameaças das pistolas, os insultos, a requisição das jóias e dos vestidos, tudo isto, que parece vilania, era nele uma sublime maneira de exprimir o seu muito ciúme e paixão.
Nunca mais vi a mestra, nem tive pessoa que me falasse de Augusto. Naturalmente o fui esquecendo, o forçoso era esquecê-lo em Paris e Londres, para onde o barão me levou, sem me dar tempo a pensar uma hora no meu passado.
De Londres fomos para Alemanha, e estávamos em Baden-Baden, quando o barão, no gozo de robusta saúde e felicidade que a cada hora me confessava, morreu subitamente de um ataque apoplético, quando se estava banhando.
Não estou a moer-lhe a paciência com os pormenores das coisas sucedidas depois da morte do meu extremoso amigo. Basta dizer-lhe que eu fiquei apenas possuidora dos objetos valiosos que tinha para meu uso, e sem esses mesmos ficaria se um português que estava em Baden-Baden me não aconselhasse a sonegá-los às averiguações da justiça. A mulher do barão veio a Portugal e habilitou-se herdeira única da grande riqueza.
Deliberei voltar para Lisboa.
***
- As minhas jóias valeriam quarenta mil cruzados.
Coadjuvada pelo serviçal português, que me aconselhara, vendi em Londres as melhores peças do meu cofre e apurei uns doze contos de réis. Cheguei a Lisboa e aluguei uma casinha agradável em Buenos Aires. Procurei minha irmã e encontrei-a com muita dificuldade, reduzida ao extremo aviltamento. Em menos de um ano, a infeliz descera a escala da abjeção, que outras descem em muitos anos de libertinagem, com reveses de miséria e luxo. Se alguma vez passou numas ruas imundas da cidade alta, onde as mulheres competem em palavras obscenas com os marinheiros embriagados, já sabe onde eu encontrei a primogénita das segundas núpcias da minha mãe.