A minha irmã morreu: já não podia vencer a morte. Prestei-lhe quantos auxílios cabiam em forças da amizade e da compaixão. Os paroxismos da infeliz foram tranquilos; e, se as lágrimas valem na presença de Deus, pode ser que o seu inferno fosse o deste mundo somente.
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- Foi Augusto visitar-me.
Falou-me do passado, e eu contei-lhe tudo que decorrera desde a sua última carta.
Não lhe ocultei os haveres, que eu tinha em inscrições, compradas com o produto das jóias. Respondi com amizade às reminiscências do seu amor. Pedi-lhe que fosse meu amigo, simplesmente meu amigo, e que não quisesse acordar um sentimento que por pouco nos não fizera a ambos desgraçados sem refúgio.
Encarreguei-o de indagar a sorte da minha mãe. Soube que ela, desde a morte do barão, estava vendendo os móveis para se sustentar e que, em breve, na opinião dos informadores, teria as filhas em conta de móveis. Augusto, industriado por mim, pode falar às meninas, na ausência da mãe, e persuadiu-as a fugirem para a minha companhia; o que elas prontamente fizeram. Ao mesmo tempo, mandei dar a minha mãe uma mesada, com a certeza de que as faria educar e preparar para um virtuoso destino.
Parece que o senhor às vezes se mostra espantado desta linguagem na boca da mulher que ontem encontrou às onze horas da noite!...
- Dizes bem, Marcolina; às vezes espanto-me. Tenho-te ouvido falar em virtude não sei quantas vezes!
- Uma.
- Só uma?! Será: mas tens tido raptos de eloquência religiosa que cabiam muito bem num livro espiritual.
- E daí que conclui? Que sou hipócrita?
- Não: concluo apenas que és mulher, mistério enigma, absurdo, paradoxo, mescla de luz do Céu, e lavareda do Inferno, demónio e anjo, etc. Continua, que eu enquanto te não vir desfalecida de falar, não te lembro que devemos jantar hoje.