Luísa sentia-lhe o hálito e o calor do corpo, quase deitada também, enervada; a sua respiração alta tinha por vezes um tom suspirado; e a certos detalhes mais picantes de Leopoldina soltava um risinho quente e curto, como de cócegas... Mas passos fortes de botas de tachas subiram a rua, e no candeeiro defronte o gás saltou com um jato vivo. Uma branda claridade pálida penetrou na sala.
Leopoldina ergueu-se logo. - Tinha de ir já, já, ao acender do gás. Estava à espera, o pobre rapaz! Entrou no quarto, mesmo às escuras, a pôr o chapéu, buscar a sombrinha. - Tinha-lhe prometido, coitado, não podia faltar. Mas realmente embirrava de ir só. Era tão longe! Se a Juliana pudesse vir acompanhá-la...
- Vai, sim, filha! - disse Luísa.
Ergueu-se preguiçosamente com um grande ai!, foi abrir a porta, e deu de cara com Juliana, na sombra do corredor.
- Credo, mulher, que susto!
- Vinha saber se queriam luz...
- Não. Vá por um xale para acompanhar a senhora D. Leopoldina! Depressa!
Juliana foi correndo.
- E quando apareces tu, Leopoldina? - perguntou Luísa.
Logo que pudesse. Para a semana estava com idéias de ir ao Porto ver a tia Figueiredo, passar quinze dias na Foz...
A porta abriu-se.
- Quando a senhora quiser... - disse Juliana.
Fizeram grandes adeuses, beijaram-se muito. Luísa disse rindo ao ouvido de Leopoldina: - Sê feliz!
Ficou só. Fechou as janelas, acendeu as velas, começou a passear pela sala, esfregando devagar as mãos. E, sem querer, não podia desprender a idéia de Leopoldina que ia ver o seu amante! O seu amante!...
Seguia-a mentalmente: caminhava depressa decerto falando com Juliana; chegava; subia a escada, nervosa; atirava com a porta - e que delicioso, que ávido, que profundo o primeiro beijo! Suspirou.