O Primo Basílio - Cap. 1: CAPÍTULO I Pág. 16 / 414

Depois desculpava-a: era tão infeliz com o marido! Ia atrás da paixão, coitada! E aquela grande palavra, faiscante e misteriosa, de onde a felicidade escorre como a água de uma taça muito cheia, satisfazia Luísa como uma justificação suficiente: quase lhe parecia uma heroína; e olhava-a com espanto como se consideram os que chegam de alguma viagem maravilhosa e difícil, de episódios excitantes. Só não gostava de certo cheiro de tabaco misturado de feno, que trazia sempre nos vestidos. Leopoldina fumava.

- E que fez ele, o Mendonça?

Leopoldina encolheu os ombros, com um grande tédio:

- Escreveu-me uma carta muito tola, que afinal bem considerado era melhor que acabasse tudo, porque não estava para se meter em camisa de onze varas! Que imbecil! Até devo ter aqui a carta.

Procurou na algibeira do vestido: tirou o lenço, uma carteirinha, chaves, uma caixinha de pó-de-arroz; mas encontrou apenas um programa do Price.

Falou então do circo. - Uma sensaboria. O melhor era um rapaz que trabalhava no trapézio. Lindo rapaz, bem feito, uma perfeição!

E de repente:

- Então teu primo Basílio chega?

- Assim li hoje no Diário de Noticias. Fiquei pasmada!

- Ah! Outra coisa que te queria perguntar antes que me esqueça. Com que guarneceste tu aquele teu vestido de xadrezinho azul? Vou mandar fazer um assim.

Tinha-o guarnecido de azul também, um azul mais escuro.

- Vem ver. Vem cá dentro.

Entraram no quarto. Luísa foi descerrar a janela, abrir o guarda-vestidos. Era um quarto pequeno, muito fresco, com cretones de um azul pálido. Tinha um tapete barato, de fundo branco, com desenhos azulados. O toucador, alto, estava entre as duas janelas, sob um dossel de renda grossa, muito ornado de frascos facetados.





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