O Primo Basílio - Cap. 11: CAPÍTULO XI Pág. 312 / 414

Escutava, com a cabeça apoiada à mão; aqueles sons entravam-lhe na alma com a doçura de vozes místicas que a chamavam; parecia-lhe que ia levada por elas, se rendia de tudo o que era terrestre e agitado, se achava numa praia deserta, junto ao mar triste, sob um frio luar - e ali, puro espírito, livre das misérias carnais, rolava nas ondulações do ar, tremia nos raios luminosos, passava sobre os urzes nos sopros salgados...

A melancólica atitude do seu corpo abatido enfureceu Jorge:

- Ó Sebastião, fazes-me favor de tocar o fandango, o Barba-Azul, o Pirolito, o diabo? Senão, se querem melancolia, eu começo com o cantochão!

E cantou, com um tom fúnebre:

- Dies irae, dies illae, Solvunt saecula in favilia!..

Luísa riu-se:

- Que doido! Nem pode a gente estar triste...

- Pode! - exclamou Jorge. - Mas então venha a bela tristeza, venha a tristeza completa. - E com uma voz medonha entoou o Bendito!

- Os vizinhos hão de dizer que estamos doidos, Jorge... - acudiu ela.

- É justamente o que nós estamos! - E entrou no escritório, atirando com a porta.

Sebastião bateu alguns compassos, e voltando-se para ela, baixo:

- Então que idéias são essas? Que melancolia é essa?

Luísa ergueu os olhos para ele; viu a sua face boa e amiga, cheia de simpatia; ia talvez dizer-lhe tudo numa explosão de dor, mas Jorge saía do escritório. Sorriu, encolheu os ombros, retomou devagar o seu crochê.

No domingo seguinte, à noite, conversava-se na sala. Julião contara o seu concurso. Em resumo, estava contente: tinha falado duas horas bem, com precisão, com lucidez.

O Dr. Figueiredo dissera-lhe que devia ter amenizado um bocado mais...

- Literatos! - fazia Julião encolhendo os ombros com desprezo.





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