Sou pela morte. Sou inteiramente pela morte. E exijo que a mates, Ernestinho!
D. Felicidade acudiu, toda bondosa:
- Deixe falar, Sr. Ledesma. Está a brincar. E ele então que é um coração de anjo!
- Está enganada, D. Felicidade - disse Jorge, de pé diante dela. - Falo sério e sou uma fera! Se enganou o marido, sou pela morte. No abismo, na sala, na rua, mas que a mate. Posso lá consentir que, num caso desses, um primo meu, uma pessoa da minha família, do meu sangue, se ponha a perdoar como um lamecha! Não! Mata-a! É um princípio de família. Mata-a quanto antes!
- Aqui tem um lápis, Sr. Ledesma - gritou Julião, estendendo-lhe uma lapiseira.
O Conselheiro, então, interveio grave:
- Não - disse -, não creio que o nosso Jorge fale sério. É muito instruído para ter idéias tão...
Hesitou, procurou o adjetivo. Juliana pôs-se-lhe diante com uma bandeja, onde um macaco de prata se agachava comicamente sob um vasto guarda-sol eriçado de palitos. Tomou um, curvou-se, e concluiu:
- ...tão anticivilizadoras.
- Pois está enganado, Conselheiro, tenho-as - afirmou Jorge. - São as minhas idéias. E aqui tem, se em lugar de se tratar de um final de ato, fosse um caso da vida real, se o Ernesto viesse dizer-me: "Sabes, encontrei minha mulher..."
- Oh, Jorge! - disseram, repreensivamente.
Bem, suponhamos, se ele mo viesse dizer, eu respondia-lhe o mesmo. Dou a minha palavra de honra, que lhe respondia o mesmo: "Mata-a!"
Protestaram. Chamaram-lhe "tigre", "Otelo", "Barba-Azul". Ele ria, enchendo muito sossegadamente o seu cachimbo.
Luísa bordava, calada; a luz do candeeiro, abatida pelo abajur, dava aos seus cabelos tons de um louro quente, resvalava sobre a sua testa branca como sobre um marfim muito polido.