O Primo Basílio - Cap. 3: CAPÍTULO III Pág. 63 / 414

eram muito das amas, faziam-se muito humildes, sabujavam, traziam de fora as histórias da rua, e cartinhas levadas e recadinhos para dentro e para fora, muito confidentes - muito presenteadas também! Ela não podia. Era "minha senhora isto! minha senhora aquilo!" E cada uma no seu lugar! Era génio!

Desde que servia, apenas entrava numa casa sentia logo, num relance, a hostilidade, a malquerença; a senhora falava-lhe com secura, de longe; as crianças tomavam-lhe birra; as outras criadas, se estavam chalrando, calavam-se, mal a sua figura esguia aparecia; punham-lhe alcunhas - a "Isca Seca", a "Fava Torrada", o "Saca-Rolhas"; imitavam-lhe os trejeitos nervosos; havia risinhos, cochichos pelos cantos; e só tinha encontrado alguma simpatia nos galegos taciturnos, cheios de uma saudade morrinhenta, que vêm de manhã quando ainda os quartos estão escuros, com as suas grossas passadas, encher os barris, engraxar o calçado.

Lentamente, começou a tornar-se desconfiada, cortante como um nordeste; tinha respostadas, questões com as companheiras; não se havia de deixar pôr o pé no pescoço!

As antipatias que a cercavam faziam-na assanhada, como um círculo de espingardas enraivece um lobo. Fez-se má; beliscava crianças até lhes enodoar a pele; e se lhe ralhavam, a sua cólera rompia em rajadas. Começou a ser despedida. Num só ano esteve em três casas. Saía com escândalo, aos gritos, atirando as portas, deixando as amas todas pálidas, todas nervosas...

A inculcadeira, a sua velha amiga, a tia Vitória, disse-lhe:

- Tu acabas por não ter onde te arrumar, e falta-te o bocado do pão!

O pão! Aquela palavra que é o terror, o sonho, a dificuldade do pobre assustou-a. Era fina, e dominou-se. Começou a fazer-se "uma pobre mulher", com afetações de zelo, um ar de sofrer tudo, os olhos no chão.





Os capítulos deste livro