- E tu, que fizeste hoje? - perguntou-lhe Basílio.
Tinha-se aborrecido muito. Estivera todo o santo dia a ler.
Também ele passara a manhã deitado no sofá a ler a Mulher de Fogo de Belot. Tinha lido, ela?
- Não, que é?
- É um romance, uma novidade.
E acrescentou sorrindo:
- Talvez um pouco picante; não to aconselho!
D. Felicidade andava a ler o Rocambole. Tanto lho tinham apregoado! Mas era uma tal trapalhada! Embrulhava-se, esquecia-se... E ia deixar, porque tinha percebido que a leitura lhe aumentava a indigestão.
- Sofre? - perguntou Basílio, com um interesse bem-educado.
D. Felicidade contou logo a sua dispepsia. Basílio aconselhou-lhe o uso do gelo. - De resto felicitava-a, porque as doenças de estômago, ultimamente, tinham muito chique. Interessou-se pela dela, pediu pormenores.
D. Felicidade prodigalizou-os; e falando, via-se-lhe crescer no olhar, na voz a sua simpatia por Basílio. Havia de usar o gelo!
- Com o vinho, já se sabe?
- Com o vinho, minha senhora!
- E olha que talvez! - exclamou D. Felicidade, batendo com o leque no braço de Luísa, já esperançada.
Luísa sorriu, ia responder - mas viu o sujeito pálido de pêra longa que fitava nela os seus olhos langorosos, com obstinação. Voltou o rosto importunada. O sujeito afastou-se, retorcendo a ponta da pêra.
Luísa sentia-se mole; o movimento rumoroso e monótono, a noite cálida, a acumulação da gente, a sensação de verdura em redor davam ao seu corpo de mulher caseira um torpor agradável, um bem-estar de inércia, envolviam-na numa doçura emoliente de banho morno. Olhava com um vago sorriso, o olhar frouxo; quase tinha preguiça de mexer as mãos, de abrir o leque.
Basílio notou o silêncio. - Tinha sono?
D. Felicidade sorriu com finura.