Os Maias - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 180 / 630

Carlos viu apenas uma pequena mancha cor-de-rosa desvanecendo-se; do «caroço» não havia vestígio; e então uma ligeira vermelhidão subiu-lhe ao rosto, procurou vivamente os olhos da condessa, como compreendendo tudo, querendo ver neles a confissão do sentimento que a trouxera ali com um pretexto pueril, sob aquela toilete negra, aqueles véus que a mascaravam...

Mas ela permaneceu impenetrável, sentada à borda do divã, com as mãos cruzadas, atenta, como esperando as suas palavras, num vago susto de mãe.

Carlos abotoou o colarinho do pequeno, e disse:

- Não é absolutamente nada, minha senhora.

No entanto, fez perguntas de médico sobre o regímen e a natureza de Charlie. A condessa, num tom pesaroso, queixou-se de que a educação da criança não fosse, como ela desejava, mais forte e mais viril; mas o pai opunha-se ao que ele chamava «a aberração inglesa», a água fria, os exercícios a todo o ar, a ginástica...

- A água fria e a ginástica, disse Carlos sorrindo, têm melhor reputação do que merecem...

É o seu único filho, senhora condessa?

- É, tem os mimos de morgado, disse ela passando a mão pelos cabelos louros do pequeno.

Carlos assegurou-lhe que, apesar do seu aspecto nervoso e delicado, Charlie não devia dar-lhe cuidado; nem havia necessidade de o exilar para os ares de Formoselha... Depois ficaram um momento calados.

- Não imagina como me tranquilizou, disse ela, erguendo-se, dando um jeito ao véu. De mais a mais é um gosto vir consultá-lo... Não há aqui o menor ar de doença, nem de remédios... E realmente tem isto muito bonito... - acrescentou, dando um olhar lento em redor aos veludos do gabinete.

- Tem justamente esse defeito, exclamou Carlos rindo. Não inspira nenhum respeito pela minha ciência... Eu estou com ideias de alterar tudo, pôr aqui um crocodilo empalhado, corujas, retortas, um esqueleto, pilhas de in-fólios...

- A cela de Fausto.

- Justamente, a cela de Fausto.

- Falta-lhe Mefistófeles, disse ela alegremente, com um olhar que brilhou sob o véu.

- O que me falta é Margarida!





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