Se assim continuassem mais alguns meses, sem que se sentisse ali um calor de vestido, um aroma de mulher, vinha a nascer a erva pelos tapetes.
- É por isso, acrescentou ele muito sério, que eu vou obrigar o avô a casar-se.
A condessa riu, os seus lindos dentes miudinhos alvejaram na sombra do véu.
- Gosto da sua alegria, disse ela.
- É uma questão de regímen. V. Ex.ª não é alegre?
Ela encolheu os ombros, sem saber... Depois, batendo com a ponta do guarda-sol na sua botina de verniz que brilhava sobre o tapete claro, murmurou com os olhos baixos, deixando ir as palavras, num tom de intimidade e de confidência:
- Dizem que não, que sou triste, que tenho spleen...
O olhar de Carlos seguira o dela, pousara-se na botina de verniz que calçava delicadamente um pé fino e comprido: Charlie, entretido, mexia nas teclas do piano - e ele baixou a voz para lhe dizer:
- É que a senhora condessa tem um mau regímen. É necessário tratar-se, voltar aqui, consultar-me... Tenho talvez muito que lhe dizer!
Ela interrompeu-o vivamente, erguendo para ele os olhos, de onde se escapou um clarão de ternura e de triunfo:
- Venha-mo antes dizer um destes dias, tomar chá comigo, às cinco horas... Charlie!
O pequeno veio logo dependurar-se-lhe do braço.
Carlos, acompanhando-a abaixo à rua, lamentava a fealdade da sua escada de pedra:
- Mas vou mandar tapetar tudo para quando a senhora condessa volte a dar-me a honra de me vir consultar...
Ela gracejou, toda risonha:
Ah não! O Sr. Carlos da Maia prometeu-nos a todos a saúde... E naturalmente não espera que seja eu que venha cá tomar chá consigo...
- Oh, minha senhora, eu quando começo a esperar, não ponho limites nenhuns às minhas esperanças...
Ela parou, com o pequeno pela mão, olhou para ele, como pasmada, encantada com aquela grandiosa certeza de si mesmo.
- Então vai por aí além, por aí além...?
- Vou por aí além, por aí além, minha senhora!
Estavam no último degrau, diante da claridade e do rumor da rua.
- Mande-me chegar um coupé.