- Então dão-me para baixo, hein, Dâmaso? murmurou Ega que, no gabinete de Carlos, embrulhado numa velha ulster, e encolhido numa poltrona, escutava estas coisas com um ar cansado e doente.
Dâmaso confessou que na sociedade lhe davam para baixo.
Ah, ele sabia-o bem! Tinha antipatias em Lisboa. Ninguém lhe perdoara ainda a peliça. A sua verve, toda em sarcasmos, ofendia. E era desagradável para muita gente que um homem, com esse espírito tão perigoso de ferro em brasa, tivesse uma mãe rica, e fosse independente.
Depois, no sábado seguinte, Carlos, ao voltar do jantar dos Gouvarinhos - que fora excelente - contou-lhe a conversa que tivera com a Sr.ª condessa. A condessa falara-lhe muito livremente, como um homem, daquele desastre do Ega. Tinha-se afligido muito, não só pela Rachel, coitada, de quem era amiga, mas pelo Ega, que ela apreciava tanto, tão interessante, tão brilhante, e que saía de tudo aquilo enxovalhado! O Cohen dizia a todos (dissera-o ao Gouvarinho) que ameaçara o Ega de pontapés, por ele ter escrito a sua mulher uma carta imunda. Os que não sabiam nada, como o Gouvarinho, acreditavam, apertavam as mãos na cabeça; e os que sabiam, os que havia seis meses sorriam da intimidade do Ega com os Cohens, afectavam também acreditar, cerravam os punhos de indignação. O Ega era odiado. E a pequena Lisboa, que vive entre o Grémio e a casa Havanesa, folgava em «enterrar» o Ega.