Carlos pensou logo em falar da sua apresentação ao Castro Gomes. Mas, como em Sintra, sem saber porquê, veio-lhe uma repugnância de a conhecer por meio do Dâmaso. E foi-se vestindo em silêncio.
Dâmaso no entanto maldizia a sua chance:
- E eu que tinha mulher, eu que a tinha, se houvesse ocasião. Mas que diabo queres tu, assim?...
Queixou-se então do Castro Gomes. Em resumo, era um telhudo. E a vida daquele homem era misteriosa... Que diabo estava ele a fazer em Lisboa? Ali havia dificuldades de dinheiro... E eles não se davam bem. Na véspera houvera decerto questão. Quando ele entrara, ela estava com os olhos vermelhos, e enfiada; e ele, nervoso, a passear pela sala, a retorcer a barba... Ambos contrafeitos, uma palavra cada quarto de hora...
- Sabes tu? exclamou ele. Tenho minha vontade de os mandar à fava.
Queixou-se também dela. Era sobretudo muito desigual. Ora bom modo, ora regelada; e, às vezes, ele dizia qualquer coisa muito natural, destas coisas de conversa de sociedade, e ela punha-se a rir. Era de encavacar, hein? Enfim, gente muito esquisita.
- Onde vais tu? disse ele, com um suspiro de aborrecimento, vendo Carlos pôr o chapéu.
Ia tomar chá com a Gouvarinho.
- Pois olha, vou contigo... Estou de uma seca! Carlos hesitou um instante, terminou por dizer:
- Vem, fazes-me até favor...
A tarde estava lindíssima, Carlos ia no dog-cart.
- Há que tempos que não damos assim um passeio juntos, disse Dâmaso.
- Tu andas lá metido com estrangeiros!...
Dâmaso deu outro suspiro, e não tornou a dizer mais nada. Depois, à porta dos Gouvarinhos, quando soube que a Sr.ª condessa recebia, resolveu subitamente não entrar. Não, não entrava. Estava muito estúpido, incapaz de achar uma palavra...
- Ah, e outra coisa que me lembrou agora, exclamou ele, demorando ainda Carlos diante do portão. O Castro Gomes, ontem, perguntou-me o que te havia de mandar pela visita à pequena... Eu disse que tu tinhas ido lá por favor, como meu amigo. E ele disse que te havia de vir deixar um bilhete... Naturalmente vens a conhecê-los.