Os Maias - Cap. 11: Capítulo 11 Pág. 312 / 630

O Domingos estava já no patamar, de casaca, risonho e bem penteado.

- É coisa de cuidado, meu senhor?

- Não é nada, Domingos... Estimei vê-lo por aqui.

- E eu muito a V. Ex.ª Até amanhã, meu senhor.

- Até amanhã.

Niniche apareceu também no patamar. Ele abaixou-se ternamente a afagá-la, e disse-lhe também, radiante:

- Até amanhã, Niniche!

- Até amanhã! Voltando para o Ramalhete, era esta a única ideia que ele sentia distintamente através da névoa luminosa que lhe afogava a alma. Agora o seu dia estava findo: - mas, passadas as longas horas, terminada a longa noite, ele penetraria outra vez naquela sala de reps vermelho, onde ela o esperava, com o mesmo vestido de sarja, enrolando ainda folhas verdes em torno de pés de rosa...

Pelo Aterro, por entre a poeira de verão e o ruído das carroças, o que ele via era essa sala, esteirada de novo, fresca, silenciosa e clara: por vezes uma frase que ela dissera cantava-lhe na memória, com o tom de ouro da sua voz; ou luziam-lhe diante dos olhos as pedras dos seus anéis entremetidos pelos pêlos de Niniche. Parecia-lhe mais linda, agora que conhecia o seu sorriso de uma graça tão delicada; era cheia de inteligência, era cheia de gosto; e a pobre velha à porta, esse doente a quem ela mandava vinho do Porto, revelavam a sua bondade... E o que o encantava é que não tornaria mais a farejar a cidade como um rafeiro perdido, à busca dos seus olhos negros; agora bastava-lhe subir alguns degraus, abria-se diante dele a porta da sua casa: e tudo de repente na vida parecia tornar-se fácil, equilibrado, sem dúvidas e sem impaciências.

No seu quarto, no Ramalhete, Baptista entregou-lhe uma carta.

- Trouxe-a a escocesa, já V. Ex.ª tinha saído.

Era da Gouvarinho! Meia folha de papel, tendo simplesmente escrito a lápis - all rigth. Carlos amarrotou-a, furioso. A Gouvarinho!... Não se tornara quase a lembrar dela, desde a véspera, no radiante tumulto em que andara o seu coração.





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