Conversando, ainda de pé, ela dava aqui e além um arranjo melhor a um livro, ou ia mover uma cadeira que não estava no seu alinho; tinha o hábito inquieto de recompor constantemente, a simetria das coisas; - e, maquinalmente, ao passar, sacudia a superfície de moveis já perfeitamente espanejados com as magnificas rendas do seu lenço.
Agora acompanhava-o sempre ao quarto de miss Sarah. Pelo corredor amarelo, caminhando ao seu lado, Carlos perturbava-se sentindo a caricia desse íntimo perfume em que havia jasmim, e que parecia sair do movimento das suas saias. Ela às vezes abria familiarmente a porta de um quarto, apenas mobilado com um velho sofá: era ali que Rosa brincava, e que tinha os arranjos de Cri-cri, as carruagens de Cri-cri, a cozinha de Cri-cri. Encontravam-na vestindo e conversando profundamente com a boneca; ou então, ao canto do sofá, com os pezinhos cruzados, imóvel, perdida na admiração de algum livro destampas aberto sobre os joelhos. Ela corria, estendia a boquinha a Carlos; e toda a sua pessoa tinha a frescura de uma linda flor.
No quarto da governante, Maria Eduarda sentava-se aos pés do leito branco; e logo a pobre miss Sarah, ainda cheia de tosse, confusa, verificando a cada instante se o lenço de seda lhe cobria correctamente o pescoço, afirmava que estava boa. Carlos gracejava com ela, provando-lhe que nesse feio tempo de inverno, a felicidade era estar ali na cama, com bons cuidados em redor, alguns romances patéticos, e apetitosa dieta portuguesa. Ela voltava os olhos gratos para Madame, com um suspiro. Depois murmurava
- Oh yes, I am very comfortable!
E enternecia-se.
Logo nos primeiros dias, ao voltar à sala, ria Eduarda tinha-se sentado na sua cadeira escarlate, e, conversando com Carlos, retomara muito naturalmente o seu bordado como na presença familiar de um velho amigo. Com que felicidade profunda ele viu desdobrar-se essa talagarça!