Os Maias - Cap. 12: Capítulo 12 Pág. 341 / 630

- Sim, talvez, é possível... Há muita verdade nisso...

Mas Ega, que estivera um pouco silencioso, entalando de vez em quando o monóculo no olho e sorrindo para a baronesa, pronunciou-se alegremente contra todas essas explorações da África, e essas longas missões geográficas... Porque não se deixaria o preto sossegado, na calma posse dos seus manipansos? Que mal fazia à ordem das coisas que houvesse selvagens? Pelo contrário, davam ao Universo uma deliciosa quantidade de pitoresco! Com a mania francesa e burguesa de reduzir todas as regiões e todas as raças ao mesmo tipo de civilização, o mundo ia tornar-se numa monotonia abominável. Dentro em breve um turista faria enormes sacrifícios, despesas sem fim, para ir a Tombuctu - para quê? Para encontrar lá pretos de chapéu alto, a ler o Jornal dos Debates!

O conde sorria com superioridade. E a boa D. Maria, saindo do seu vago abatimento, movia o leque, dizia a Carlos, deleitada:

- Este Ega! Este Ega! Que graça! Que chic!

Então Sousa Neto, pousando gravemente o talher, fez ao Ega esta pergunta grave:

- V. Ex.ª pois é em favor da escravatura?

Ega declarou muito decididamente ao Sr. Sousa Neto que era pela escravatura. Os desconfortos da vida, segundo ele, tinham começado com a libertação dos negros. Só podia ser seriamente obedecido, quem era seriamente temido... Por isso ninguém agora lograva ter os seus sapatos bem envernizados, o seu arroz bem cozido, a sua escada bem lavada, desde que não tinha criados pretos em quem fosse licito dar vergastadas... Só houvera duas civilizações em que o homem conseguira viver com razoável comodidade: a civilização romana, e a civilização especial dos plantadores da Nova Orleães. Porquê? Porque numa e noutra existira a escravatura absoluta, a sério, com o direito de morte!...

Durante um momento o Sr. Sousa Neto ficou como desorganizado. Depois passou o guardanapo sobre os beiços, preparou-se, encarou o Ega:

- Então V. Ex.ª nessa idade, com a sua inteligência, não acredita no Progresso?

- Eu não senhor.





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