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Capítulo 12: Capítulo 12

Página 362

- Essa concepção do paraíso, exclamou ele, parece-me de um estofador da rua Augusta! Como natureza, couves-galegas; como decoração, os velhos cretones do gabinete, desbotados já por três barrelas... Um quarto de dormir lúgubre como uma capela de santuário... Um salão confuso como o armazém de um cara-de-pau, e onde não é possível conversar... A não ser o armário holandês, e um ou outro prato, tudo aquilo é um lixo arqueológico... Jesus! o que eu odeio bric-à-brac!

Carlos, no fundo da sua poltrona, disse tranquilamente, e como reflectindo:

- Com efeito esses cretones são medonhos... Mas eu vou mandar remobilar, tornar aquilo mais habitável.

Ega estacou no meio do quarto, com o monóculo a faiscar sobre Carlos.

- Habitável? vais ter hóspedes?

- Vou alugar.

- Vais alugar! A quem?

E o silêncio de Carlos, que soprava o fumo da cigarrete com os olhos no tecto, enfureceu Ega. Cumprimentou quase até ao chão, disse sarcasticamente:

- Peço perdão. A pergunta foi brutal. Tive agora o ar de querer arrombar uma gaveta fechada... O aluguer de um prédio é sempre um desses delicados segredos de sentimento e de honra em que não deve roçar nem a asa da imaginação... Fui rude... Irra! Fui bestialmente rude!

Carlos continuava calado. Compreendia bem o Ega - e quase sentia um remorso daquela sua rígida reserva. Mas era como um pudor que o enleava, lhe impedia de pronunciar sequer o nome de Maria Eduarda. Todas as suas outras aventuras as contara ao Ega; e essas confidências constituíam talvez mesmo o prazer mais solido que elas lhe davam. Isto, porém, não era «uma aventura». Ao seu amor misturava-se alguma coisa de religioso; e, como os verdadeiros devotos, repugnava-lhe conversar sobre a sua fé... Todavia, ao mesmo tempo, sentia uma tentação de falar dela ao Ega, e de tornar vivas, e como visíveis aos seus próprios olhos, dando-lhes o contorno das palavras e o seu relevo, as coisas divinas e confusas que lhe enchiam o coração. Além disso, Ega não saberia tudo, mais tarde ou mais cedo, pela tagarelice alheia? Antes lho dissesse ele, fraternalmente.

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Capa do livro Os Maias
Páginas: 630
Página atual: 362

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 26
Capítulo 3 45
Capítulo 4 75
Capítulo 5 98
Capítulo 6 126
Capítulo 7 162
Capítulo 8 189
Capítulo 9 218
Capítulo 10 260
Capítulo 11 301
Capítulo 12 332
Capítulo 13 365
Capítulo 14 389
Capítulo 15 439
Capítulo 16 511
Capítulo 17 550
Capítulo 18 605