Carlos exclamava para o Ega, com os olhos já apaixonados:
- Isto agora é sério. Precisamos arranjar imediatamente a casa para a redacção!
Ega bracejava:
- Pudera! E móveis! E máquinas!
Toda a manhã, no escritório d'Afonso, azafamados, com papel e lápis, se ocuparam em fixar uma lista de colaboradores. Mas já as dificuldades surgiam. Quase todos os escritores sugeridos desagradavam ao Ega, por lhes faltar no estilo aquele requinte plástico e parnasiano de que ele desejava que a Revista fosse o impecável modelo. E a Carlos alguns homens de letras pareciam impossíveis... - sem querer confessar que neles lhe repugnava exclusivamente a falta de linha e o fato mal feito...
Uma coisa porém ficou decidida: a casa da redacção. Devia ser mobilada luxuosamente, com sofás do consultório de Carlos e algum bric-à-brac da Toca: e sobre a porta (ornada de um guarda-portão de libré) a tabuleta de verniz preto, com Revista de Portugal em altas letras a ouro. Carlos sorria, esfregava as mãos, pensando na alegria de Maria ao saber esta decisão que o lançava, como era o desejo dela, na actividade, numa luta interessante de ideias. Ega, esse, via já a brochura cor de canário aos montões nas vitrines dos livreiros, discutida nas soirées do Gouvarinho, folheada na camara com espanto pelos políticos...
- Vai-se remexer Lisboa este inverno, Sr. Afonso da Maia! gritou ele atirando um gesto imenso até ao tecto.
E o mais contente era o velho.
Depois de jantar, Carlos pediu ao Ega para ir com ele à rua de S. Francisco (onde Maria se instalara nessa manhã) levarem a nova da grande obra. Mas encontraram à porta uma carroça descarregando malas; e a senhora, contou o Domingos que ajudava os carroceiros, esteve ainda jantando a um canto da mesa e sem toalha. Com tanta confusão na casa, Ega não quis subir.
- Até logo, disse ele. Vou talvez procurar o Simão Craveiro e falar-lhe da Revista.
Subiu lentamente o Chiado, leu os telegramas na Casa Havaneza. Depois à esquina da rua Nova da Trindade, um homem rouco, sumido num paletó, ofereceu-lhe uma «senhazinha». Outros, em volta, gritavam na sombra do Hotel Aliança: