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Capítulo 15: Capítulo 15

Página 503
Outro, esguio, com o paletó solto sobre as costas em arco, tinha um queixo duro e maciço de cavalo: e dois padres muito rapados, muito morenos, fumavam pontas de cigarro. Em todos havia esse ar, conjuntamente apagado e desconfiado, que marca os homens de província, perdidos entre as tipoias e as intrigas da Capital. Vinham ali às noites, àquele jornal do partido, saber as novas, beber do fino, uns com esperanças de empregos, outros por interesses de terriola, alguns por ociosidade. Para todos o Neves era um «robusto talento»; admiravam-lhe a verbosidade e a táctica; decerto gostavam de citar nas lojas das suas vilas o amigo Neves, o jornalista, o da Tarde...

Mas, através dessa admiração e do prazer de roçar por ele, percebia-se-lhes um vago medo que aquele «robusto talento» lhes pedisse, num vão de janela, duas ou três moedas. O Neves no entanto celebrava o Gouvarinho como orador. Não que tivesse os rasgos, a pureza, as belas sínteses históricas do José Clemente! Nem a poesia do Rufino! Mas não havia outro para as piadas que ferem e que ficam cravadas, ali a arder, na pele do touro! E era a grande coisa na Câmara - ter a farpa, sabê-la ferrar!

- Ó Gonçalo, tu lembras-te da piada do Gouvarinho, a do trapézio? gritou ele virando-se para a janela, para o rapaz de jaquetão claro.

O Gonçalo, cujos olhos pretos refulgiram de agudeza e malícia, estendeu o pescoço magro num colarinho muito decotado, lançou de lá:

- A do trapézio? Divina! Conta à rapaziada!

A rapaziada arregalou os olhos para o Neves, à espera da «do trapézio». fora na amara dos Pares, na reforma da instrução.

Estava falando o Torres Valente, esse maluco que defendia a ginástica dos colégios e queria as meninas a fazerem a prancha.

Gouvarinho ergue-se e atira-lhe esta:

«Sr. presidente, direi uma palavra só. Portugal sairá para sempre da senda do progresso, em que tanto se tem ilustrado, no dia em que nós formos ao ensino, com mão ímpia, substituir a cruz pelo trapézio!»

- Muito bem! rosnou um dos padres profundamente satisfeito.

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Capa do livro Os Maias
Páginas: 630
Página atual: 503

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 26
Capítulo 3 45
Capítulo 4 75
Capítulo 5 98
Capítulo 6 126
Capítulo 7 162
Capítulo 8 189
Capítulo 9 218
Capítulo 10 260
Capítulo 11 301
Capítulo 12 332
Capítulo 13 365
Capítulo 14 389
Capítulo 15 439
Capítulo 16 511
Capítulo 17 550
Capítulo 18 605