Os Maias - Cap. 18: Capítulo 18 Pág. 626 / 630

- Sabe tudo? exclamou Ega, que saltara do parapeito.

- Tudo não. Ela diz que Mr. de Trelain conhecia do seu passado «todos aqueles erros em que ela caíra inconscientemente». Isto dá a entender que não sabe tudo... Vamos andando, que se faz tarde, e quero ainda ver os meus quartos.

Desceram ao jardim. Um momento seguiram calados pela álea onde cresciam outrora as roseiras de Afonso. Sob as duas olaias ainda existia o banco de cortiça; Maria sentara-se ali, na sua visita ao Ramalhete, a atar num ramo flores que ia levar como relíquia. Ao passar Ega cortou uma pequenina margarida que ainda floria solitariamente.

- Ela continua a viver em Orleães, não é verdade?

Sim, disse Carlos, vivia ao pé de Orleães, numa quinta que lá comprara, chamada Les Rosières. O noivo devia habitar nos arredores algum pequeno château. Ela chamava-lhe «vizinho». E era naturalmente um gentil-homem campagnard, de família séria, com fortuna...

Ela só tem o que tu lhe dás, está claro.

- Creio que te mandei contar tudo isso, murmurou Carlos. Enfim ela recusou-se a receber parte alguma da sua herança... E o Vilaça arranjou as coisas por meio de uma doação que lhe fiz, correspondente a doze contos de reis de renda...

- É bonito. Ela falava de Rosa na carta?

- Sim, de passagem, que ia bem... Deve estar uma mulher.

- E bem linda!

Iam subindo a escadinha de ferro torneada que levava do jardim aos quartos de Carlos. Com a mão na porta da vidraça, Ega parou ainda, numa derradeira curiosidade:

- E que efeito te fez isso?

Carlos acendia o charuto. Depois atirando o fosforo por cima da varandinha de ferro onde uma trepadeira se enlaçava:

- Um efeito de conclusão, de absoluto remate. É como se ela morresse, morrendo com ela todo o passado, e agora renascesse sob outra forma. Já não é Maria Eduarda. É Madame de Trelain, uma senhora francesa. Sob este nome, tudo o que houve fica sumido,

enterrado a mil braças, findo para sempre, sem mesmo deixar memória... Foi o efeito que me fez.

- Tu nunca encontraste em Paris o Sr. Guimarães?

- Nunca. Naturalmente morreu.





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