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Capítulo 4: Capítulo 4

Página 80

João da Ega, com efeito, era considerado não só em Celorico, mas também na Academia que ele espantava pela audácia e pelos ditos, como o maior ateu, o maior demagogo, que jamais aparecera nas sociedades humanas. Isto lisonjeava-o: por sistema exagerou o seu ódio à Divindade, e a toda a Ordem social: queria o massacre das classes-médias, o amor livre das ficções do matrimónio, a repartição das terras, o culto de Satanás. O esforço da inteligência neste sentido terminou por lhe influenciar as maneiras e a fisionomia; e, com a sua figura esgrouviada e seca, os pêlos do bigode arrebitados sob o nariz adunco, um quadrado de vidro entalado no olho direito - tinha realmente alguma coisa de rebelde e de satânico. Desde a sua entrada na Universidade renovara as tradições da antiga Boémia: trazia os rasgões da batina cozidos a linha branca; embebedava-se com carrascão; à noite, na Ponte, com o braço erguido, atirava injúrias a Deus. E no fundo muito sentimental, enleado sempre em amores por meninas de quinze anos, filhas de empregados, com quem às vezes ia passar a soirée, levando-lhes cartuchinhos de doce. A sua fama de fidalgote rico tornava-o apetecido nas famílias.

Carlos escarnecia estes idílios futricas; mas também ele terminou por se enredar num episódio romântico com a mulher de um empregado do governo civil, uma lisboetazinha, que o seduziu pela graça de um corpo de boneca e por uns lindos olhos verdes. A ela o que a fantasiara fora o luxo, o groom, a égua inglesa de Carlos. Trocaram-se cartas; e ele viveu semanas banhado na poesia áspera e tumultuosa do primeiro amor adúltero. Infelizmente a rapariga tinha o nome bárbaro de Hermengarda; e os amigos de Carlos, descoberto o segredo, chamavam-lhe já Eurico o presbítero, dirigiam para Celas missivas pelo correio com este nome odioso.

Um dia Carlos, andava tomando o sol na Feira, quando o empregado do governo civil passou junto dele com o filhinho pela mão. Pela primeira vez via tão de perto o marido de Hermengarda. Achou-o enxovalhado e macilento.

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Capa do livro Os Maias
Páginas: 630
Página atual: 80

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 26
Capítulo 3 45
Capítulo 4 75
Capítulo 5 98
Capítulo 6 126
Capítulo 7 162
Capítulo 8 189
Capítulo 9 218
Capítulo 10 260
Capítulo 11 301
Capítulo 12 332
Capítulo 13 365
Capítulo 14 389
Capítulo 15 439
Capítulo 16 511
Capítulo 17 550
Capítulo 18 605