O Processo - Cap. 9: Capítulo 9 Pág. 163 / 183

Entretanto já se estava a fazer tarde e receava não chegar a tempo ao encontro. Apanhou um táxi; à última hora lembrou-se do álbum que não tivera oportunidade de manusear mais cedo e, por isso, levou-o consigo. Colocou-o sobre os joelhos e, impacientemente, tamborilou nele durante toda a viagem. A chuva abrandara, mas o dia estava frio, húmido e sombrio, de modo que não deveria ser possível ver bem a catedral por dentro e não havia dúvida de que permanecer no meio daquelas lajes só iria piorar a constipação de K.

A praça da catedral estava completamente deserta. K. recordou-se de como em criança ficava surpreendido com o facto de as casas desta pequena praça terem quase todas as persianas sempre corridas. É claro que, num dia como este, até era compreensível. A catedral parecia deserta também; não havia certamente justificação para que alguém a visitasse numa altura destas. K. encaminhou-se por entre as naves laterais e não viu ninguém a não ser uma velhote, toda embuçada num xale, que estava ajoelhada à frente de uma imagem da Virgem Maria, prestando-lhe culto. Em seguida, viu à distancia um bedel coxo desaparecer por uma porta na parede. K. tinha sido pontual, estavam a bater exactamente as dez horas quando ele entrou, mas o italiano não tinha ainda chegado. Voltou à porta principal, permaneceu ali indeciso por uns instantes e deu em seguida a volta ao edifício, à chuva, para se certificar de que o italiano não estava em qualquer das outras portas laterais. Não estava em nenhum sítio. Teria o director feito confusão com a hora? Como é que uma pessoa podia afirmar que estava seguro de ter percebido aquele homem? Quaisquer que fossem as circunstâncias, K. teria, pelo menos, de esperar meia hora por ele. Como estava fatigado, sentiu vontade de se sentar, pelo que entrou novamente na catedral, encontrou num degrau um bocado de qualquer coisa semelhante a uma carpete, empurrou-o com o pé para junto de um banco, aconchegou bem o sobretudo, levantou a gola e sentou-se. Para preencher o tempo, abriu o álbum e folheou-o lentamente, tendo quase logo de parar, visto que a escuridão aumentara tanto que ele mal conseguia distinguir um único pormenor na nave mais próxima.





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