O Processo - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 20 / 183

«O meu quarto?», perguntou Fräulein Bürsrner, lançando um olhar crítico em redor do quarto, em vez de olhar para ele. «Exactamente», respondeu K., e pela primeira vez olharam um para o outro. Anão interessa lá muito a maneira como isto aconteceu.» «Mas com certeza que essa é realmente a parte mais interessante», comentou Fraulein Bürstner. «Não», disse K. «Bem», continuou Fräulein Bürstner, «não quero intrometer-me nos seus segredos; se o senhor insiste em que não tem interesse, calo-me. Pediu-me que o desculpasse e eu faço-o, em virtude de não ver qualquer indicio de distúrbio.» Com as mãos nas ancas, deu uma volta pelo quarto. À frente do quadro onde as fotografias estavam expostas, parou. «Olhe para isto» gritou ela, «as minhas fotografias estão todas revolvidas! Isto é realmente detestável! Na verdade, deve ter estado aqui alguém que não tinha o direito de aqui entrar.» K. meneou a cabeça silenciosamente, amaldiçoando Kaminer, que nunca conseguia controlar o seu estúpido tique nervoso de mexer em tudo. «É curioso», disse Fräulein Bürstner, «que seja obrigada a proibi-lo de fazer uma coisa que o senhor, por si próprio, devia ter evitado, isto é, entrar no meu quarto durante a minha ausência.» «Mas já lhe expliquei, Fraulein Bürstner», disse K., examinando minuciosamente as fotografias, «que não fui eu quem revolveu isto. Mais ainda, como não quer acreditar em mim, tenho de lhe confessar que esteve aqui hoje uma comissão de inquérito que trouxe consigo três funcionários do Banco, um dos quais se deve ter entretido a mexer nas suas fotografias, mas que despedirei na primeira oportunidade.» Em resposta ao olhar interrogativo de Fraulein Bürstner, K. acrescentou: «Sim, esteve aqui hoje uma comissão de inquérito.» «Por sua causa?», perguntou Fraulein Bürsmer. «Sim», respondeu K «Não pode ser!», gritou a rapariga a rir. «Mas é verdade», volveu K. «Por que razão acha que devo estar inocente?» «Bem, inocente.. », disse ela, «não quero comprometer-me prematuramente a dar uma sentença com tantas possíveis implicações e, além disso, não o conheço realmente bem; de qualquer maneira, deve ser um crime grave para aqui ter de vir uma comissão de inquérito. Todavia, como o senhor ainda está em liberdade... pelo menos pela sua aparência, vejo que não acabou de se evadir da prisão . não poderá efectivamente ter cometido um crime grave.» «Sim», afirmou K., «mas a comissão de inquérito deve ter apurado, não que eu estou inocente, mas que não estou tão culpado como me tinham julgado.» «É possível», disse Fraulein Bürstner muito atenta. «Não tem muita experiência em assuntos jurídicos, pois não?», inquiriu K. «Não, não tenho», respondeu ela, «e tenho frequentemente lamentado isso, dado que vivo ciosa de aprender tudo o que há para se saber e os tribunais muito particularmente atraem a minha atenção.





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