O Processo - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 30 / 183

K. talvez não tivesse obedecido se ela não houvesse ido até junto dele, não tivesse agarrado no puxador da porta e não houvesse dito: «Tenho de fechar esta porta logo que você entre, mais ninguém pode entrar.» «É muito acertado», disse K., «mas a sala já está demasiadamente cheia.» disse K., Contudo, voltou a entrar. Entre dois homens que estavam a conversar mesmo junto à porta — um, com as duas mãos estendidas, fazia o gesto de quem está a pagar dinheiro, enquanto o outro o olhava penetrantemente nos olhos —, uma mão estendeu-se e agarrou K. Pertencia a um moço de bochechas vermelhas. «Ande, venha», disse ele. K. deixou-se conduzir. Pareceu-lhe que, na confusa e maciça multidão, uma passagem estreita estava finalmente aberta, separando certamente duas facções diferentes; a favor desta suposição havia o facto de, tanto à direita como à esquerda, K. mal ver um rosto voltado para si, vendo unicamente as costas das pessoas que dirigiam a palavra e os gestos aos membros do seu próprio partido. A maioria vestia casacos pretos, domingueiros, já velhos, compridos e soltos. Este vestuário era a única coisa que fazia confusão a K., pois, de outro modo, teria chegado à conclusão de que estava em presença de um comício político.

No outro extremo da sala, em direcção ao qual K. estava a ser conduzido, havia um estrado um tanto baixo e apinhado de gente, com uma mesa colocada obliquamente sobre ele, atrás da qual, perto da borda do estrado, se via um homem baixo e gordo sentado e a conversar, ofegante e divertidamente, com um outro que se encontrava mesmo atrás dele e que apoiava um cotovelo nas costas da cadeira e tinha as pernas cruzadas. O homem baixo e gordo levantava de vez em quando os braços no ar, como se estivesse a ridicularizar alguém. O moço que guiava K. encontrou uma certa dificuldade em anunciar a sua presença. Por duas vezes se pôs em bicos de pés e tentou dizer qualquer coisa, sem, contudo, ter sido notado pelo homem que estava acima dele. Só quando uma das pessoas que se encontravam no estrado apontou para o moço é que o homem se voltou para ele e se inclinou para escutar as suas titubeantes palavras. Então tirou o relógio da algibeira e, com uma rápida olhadela a K., comentou: .O senhor já aqui devia estar há uma hora e cinco minutos.» K. ia responder, mas não teve tempo de o fazer, porque, mal o homem acabara de falar, se ouviu uma onda de protestos vinda da ala direita da sala.





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