O Processo - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 32 / 183

Esta resposta provocou uma tão natural explosão de riso na ala direita que K não conseguiu deixar de rir também. As pessoas, inclinadas e com as mãos sobre os joelhos, riam tanto que se sacudiam como se tivessem espasmos de tosse. Havia mesmo algumas gargalhadas que vinham da galeria. O Juiz de Instrução, agora indignado e não tendo aparentemente autoridade para controlar as pessoas da sala, acabou por descarregar o seu descontentamento sobre as da galeria. Levantando-se, carregou os sobrolhos até se contraírem em forma de grandes escovas pretas sobre os olhos.

A ala esquerda da sala continuava silenciosa. As pessoas ali formavam filas, viradas para o estrado, e escutavam, insensíveis ao que se passava lá em cima, bem como ao barulho no resto da sala. Efectivamente, até suportavam as conversas que alguns dos seus membros tinham iniciado com os da outra facção. Estas pessoas do partido da esquerda, que não eram tão numerosas como as outras, deviam ser, na realidade, tão pouco importantes como elas, mas o seu comportamento fazia parecer que eram mais importantes. Quando K. iniciou o seu discurso, ficou convencido de que realmente seguia o ponto de vista deles.

«O senhor perguntou-me se sou um pintor de casas — ou antes, não perguntou, afirmou —, o que é típico da natureza deste processo que me está sendo sub-repticiamente preparado. O senhor poderá objectar que não é de modo nenhum um processo; está dentro da razão, pois não será um processo a não ser que eu o reconheça como tal. Mas, de momento, por comparação, reconheço-o como se fosse. Ninguém pode considerá-lo como tal a não ser por compaixão, se efectivamente tiver de o analisar. Não digo que o seu procedimento seja desprezível, mas gostaria de lhe apresentar esse epíteto para seu próprio governo.» K. parou e passou os olhos pela sala em baixo. Tinha falado Puramente, mais Puramente até do que tencionava, mas com toda a justificação. As suas palavras deviam ter merecido aplausos de qualquer espécie, no entanto, estava tudo calmo. A audiência parecia estar claramente à espera, muito atentamente, do que se ia seguir. Talvez àquele silêncio se seguisse uma explosão que pusesse fim a tudo aquilo. K. ficou aborrecido quando a porta ao fundo da sala se abriu para dar entrada à jovem lavadeira, que parecia ter acabado o seu trabalho. Apesar de todo o cuidado com que entrara, conseguiu distrair parte da audiência. Entretanto, o facto de o Juiz de Instrução parecer bastante aterrado com o discurso de K. fez com que este se sentisse regozijado.





Os capítulos deste livro