O Processo - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 5 / 183

Isto é tudo o que somos, mas compreendemos perfeitamente que os chefes para quem trabalhamos, antes de ordenarem uma prisão como esta, devem estar devidamente informados das razões que a motivam e da pessoa do preso. Não pode assim haver qualquer engano. Os nossos funcionários, tanto quanto os conheço, e eu apenas lido com os menos categorizados, não andam à caça dos crimes das pessoas, mas, tal como a lei exige, vão direitos ao culpado, enviando-nos a nós, os guardas. Esta é a lei. Como pode, pois, haver um engano?» «Desconheço esta lei», respondeu K. «Tanto pior para si», replicou o guarda. «E provavelmente ela não existe, a não ser nas vossas cabeças», volveu K., tentando captar o pensamento dos guardas e virá-los para o seu lado ou então adaptar-se ele próprio a eles. Mas o guarda disse apenas numa voz desencorajadora: «O senhor ainda volta à carga.» Franz interrompeu: «Olha, Willem, ele diz que não conhece a lei e, no entanto, declara que está inocente.» «Tens inteira razão, mas nunca conseguirás que um homem desta força reconheça onde está a razão», replicou o outro. K. não fez mais objecções. Mas pensou: Vou deixar que estes miseráveis mercenários—que é o que eles próprios admitem ser—estabelecem com a sua tagarelice uma maior confusão no meu espírito? Falam de coisas que náo entendem de maneira nenhuma, pois só a estupidez os conduz a tal certeza. Uma troca de palavras com um homem com o mesmo nivel de inteligencia que o meu tornaria tudo muito mais simples do que horas de conversa com estes dois. Passeou de um lado para o outro, umas poucas de vezes, na parte livre do seu quarto e reparou então que a velhota do outro lado da rua tinha arrastado para a janela um homem ainda mais velho do que ela, que enlaçava pela cintura. K sentiu vontade de pôr fim a esta farsa. «Levem-me ao vosso chefe!», pediu ele. «Quando ele mo ordenar, nunca antes», replicou o guarda Willem. «E agora aconselho-o a ir para o seu quarto, a conservar-se ali quieto e a aguardar o que vier a ser decidido a seu respeito», continuou ele. «Aconselhamo-lo a não se deixar perturbar por pensamentos inúteis e a dominar-se, pois vai ser exigido muito de si. O senhor não tem correspondido ao nosso amável tratamento; esquece-se de que, quem quer que sejamos, somos pelo menos homens livres comparados consigo, o que é de certo modo uma vantagem. De qualquer maneira, caso o senhor tenha algum dinheiro, poderemos ir buscar-lhe o pequeno-almoço ao café ali da frente.»





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