O Processo - Cap. 3: Capítulo 3 Pág. 50 / 183

Ao entrar, quase tropeçou, visto que atrás da porta havia mais um degrau. «Não têm muita consideração pelo público», disse ele. «Não têm consideração de espécie nenhuma», respondeu o oficial de diligências. «Olhe só para esta sala de espera.» Era um comprido corredor que comunicava com as várias repartições do mesmo andar através de portas mal ajustadas. Embora não houvesse uma única janela que permitisse a entrada de luz, não estava completamente escuro, pois alguns dos gabinetes não eram totalmente isolados do corredor, visto as paredes serem constituídas por grades de madeira que chegavam até ao tecto e através das quais penetrava a luz e se podiam ver alguns funcionários, uns escrevendo sentados às secretárias e outros junto às grades de madeira a espreitar pelas aberturas as pessoas que estavam na sala de espera. Havia ali apenas algumas pessoas, talvez por ser domingo. De tempos a tempos, as pessoas que esperavam sentavam-se isoladamente nos bancos de madeira que, em fila, se viam de cada lado do corredor. Todas elas estavam negligentemente vestidos, embora, pela expressão dos seus rostos, maneira de estar, corte das barbas e muitos outros pequenas pormenores quase imperceptíveis, se concluísse que pertenciam as classes mais elevadas. Como não havia cabides no corredor, as pessoas colocavam chapéus debaixo dos bancos onde se sentavam, de modo que cada um que chegava ia seguindo o exemplo dos outros. Quando os que estavam sentados mais próximo da porta se aperceberam da presença de K. e do oficial de diligências, ergueram-se educadamente, tendo os outros seguido o exemplo, por pensarem que era necessário levantarem-se, de modo que todos se tinham levantado quando os dois homens passaram. Não estavam completamente direitos, as costas conservavam-se curvadas, os joelhos dobrados, parecendo mendigos da rua. K. esperou pelo oficial de diligências, que vinha um pouco atrás dele, e disse-lhe: «Como esta gente deve ser humilde!» «Sim», respondeu o outro, «estes são os acusados, todos eles são réus.» «Na verdade?», exclamou K. «Então são meus colegas., E, voltando-se para o que estava mais próximo, um homem alto, esbelto, com os cabelos quase grisalhos, perguntou-lhe delicadamente: «De que é que o senhor está à espera?» A pergunta foi, todavia, tão inesperada que deixou o homem confuso, e o facto foi tanto mais embaraçoso quanto, sendo ele um homem obviamente conhecedor do mundo, teria sabido perfeitamente como portar-se em qualquer outro lugar e não teria de maneira nenhuma renunciado à sua natural superioridade.





Os capítulos deste livro