O Processo - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 92 / 183

Nem se tornava necessário que o Dr. Huld se deslocasse ao tribunal com frequência, que esperasse na antessala dos juízes de instrução que estes se decidissem a aparecer e que estivesse dependente da boa ou má disposição destes para conseguir talvez um sucesso ilusório ou nem mesmo isso. Não, tal como K. havia pessoalmente observado, os funcionários e, diremos mesmo, os muito categorizados entre eles, costumavam visitar o Dr. Huld por decisão própria, dando voluntariamente informações com toda a franqueza ou, pelo menos, sugestões suficientemente claras, discutindo o imediato seguimento dos vários processos; mais ainda, deixando-se persuadir, por vezes, por um novo ponto de vista. É certo que não se devia depositar inteira confiança na rápida aceitação do novo ponto de vista, porque, se bem que tivessem declarado definitivamente aquela sua opinião, tão favorável à defesa, podia acontecer que fossem direitos aos seus gabinetes e emitissem um relatório com um sentido directamente oposto ou ainda mais severo para o réu do que a primitiva intenção, à qual tinham alegado haver renunciado completamente. Não há dúvida de que contra isto não havia qualquer remédio, visto que o que eles tinham dito particularmente tinha simplesmente sido dito particularmente e não podia ser seguido em público, mesmo que a defesa não fosse obrigada, por razões várias, a fazer o possível por manter os favores daquelas entidades. Por outro lado, era igualmente de considerar que não era por mero sentido de humanidade ou de amizade que visitavam advogados de defesa — só advogados experientes, claro; realmente, estavam, até certo ponto, dependentes da defesa. Eram inevitáveis as desvantagens que se faziam sentir de um sistema judiciário que insistia desde o principio na confidencialidade. O facto de se manterem à distancia impedia que os funcionários contactassem com o público; no entanto, em processos vulgares, encontravam-se com bagagem suficiente, visto que processos desta ordem seguiam quase mecanicamente o seu caminho e apenas precisavam de um empurrão aqui e ali. Confrontados, porém, com processos muito simples ou com casos particularmente difíceis, era frequente encontrarem-se totalmente perplexos, pois não possuíam o mínimo conhecimento das relações humanas devido ao facto de passarem dia e noite amarrados ao funcionamento daquele sistema jurídico no qual se tornava indispensável o conhecimento da própria natureza humana. Era então que se viam obrigados a ir pedir conselho aos advogados, levando atrás deles um contínuo com os documentos que usualmente eram conservados secretos. Não se esperaria encontrar ali, sentados àquela janela, certos indivíduos que, numa situação desesperada, contemplavam a rua, enquanto o advogado, sentado à sua secretaria, examinava os documentos na esperança de lhes poder dar um bom conselho.





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