Fora, na verdade, o seu pedido que ocasionara a alteração do retrato? Não poderia haver para tudo isso alguma curiosa explicação científica? Se o pensamento podia exercer a sua influência sobre um organismo vivo, não podia igualmente actuar sobre as coisas inertes e inorgânicas? Destituídas de pensamento ou desejo consciente, não podiam as coisas externas a nós vibrar em uníssono com os nossos caprichos e as nossas paixões, o átomo atraindo o átomo num secreto amor, numa estranha afinidade? Mas nada importava a razão. Nunca mais por um pedido tentaria força alguma terrível. Se o retrato tinha de mudar, mudaria. Nada mais. Porque pretender esmiuçar profundamente o caso?
Haveria, assim, um autêntico prazer em espiar a modificação operada nas suas feições. Poderia seguir o seu pensamento até os seus mais recônditos refolhos. Este retrato seria para ele o mais mágico dos espelhos. Assim como lhe revelara o aspecto exterior do seu corpo, assim lhe revelaria a intimidade da sua alma. E, quando sobre o retrato caísse o inverno, ele continuaria gozando os esplendores da primavera e do verão.