— Mas os governantes são infalíveis, em cada cidade, ou susceptíveis de se enganarem?
— É evidente — respondeu — que são susceptíveis de se enganarem.
— Portanto, quando empreendem elaborar leis, fazem-nas boas e más?
— É o que penso.
— As boas são as que instituem o que lhes é vantajoso e as más o que lhes é desvantajoso? Ou, então, como dizes tu?
— Assim.
— Mas o que instituíram deve ser feito pelos governados, e nisso consiste a justiça?
— Com certeza.
— Portanto, não sã é justo, na tua opinião, fazer o que é vantajoso para o mais forte, mas também o contrário, o que é desvantajoso.
— Que estás a dizer? — gritou.
— O que tu mesmo dizes, parece-me; mas vejamos melhor. Não reconhecemos que, às vezes, os governantes se enganavam quanto ao que é o melhor, prescrevendo certas coisas aos governados? E que, por outro lado, era justo que os governados fizessem o que lhes prescrevem os governantes? Não o reconhecemos?
— Creio que sim — confessou.
Então, crê também — prossegui — que reconheceste justo fazer o que é desvantajoso para os governantes e os mais fortes, quando os governantes dão involuntariamente ordens que lhes são prejudiciais; porquanto tu pretendes que é justo que os governados façam o que ordenam os governantes. Então, muito sábio Trasímaco, não se segue necessariamente que é justo fazer o contrário do que o que dizes? Com efeito, ordena-se ao mais fraco que faça o que é desvantajoso para o mais forte.