Então, o mancebo, que vê e ouve tudo isso, que, por outro lado, ouve os discursos do pai, vê de perto as suas ocupações e compara-as com as dos outros, sente-se atraído de dois lados: pelo pai, que rega e faz crescer o elemento racional da sua alma, e pelos outros, que fortalecem os seus desejos e paixões; como o seu carácter não é vicioso, apenas teve más companhias, escolhe o meio entre os dois partidos que o atraem, entrega o governo da sua alma ao princípio intermédio de ambição e cólera e torna-se um homem altivo e enamorado de honras.
- Descreveste muito bem, segundo me parece, a origem e desenvolvimento desse carácter.
- Temos então - disse eu - a segunda constituição e o segundo tipo de homem.
-Assim é.
- Depois disto, falaremos, como Ésquilo, «de outro homem alinhado em
face de outro Estado», ou, antes, seguindo a ordem que adoptámos, começaremos pelo Estado?
- Certamente - disse ele.
- Creio que é a oligarquia que se segue ao governo precedente.
- Que espécie de constituição entendes por oligarquia? - perguntou.
- O governo - respondi - que se fundamenta no censo, em que os ricos mandam e onde o pobre não participa no poder.
- Compreendo.
- Não devemos começar por dizer como se passa da timocracia à oligarquia?
- Sim, devemos,
- Na verdade, até um cego veria como se faz esta passagem.
-Como?
- Esse tesouro - disse eu - que cada um enche de ouro perde a timocracia; em primeiro lugar, os cidadãos descobrem motivos de despesa e, para os satisfazerem, contornam a lei e desobedecem-lhe, eles e as suas mulheres.
- É verosímil.
- Em seguida, ao que suponho, um vendo o outro e apressando-se a imitá-lo, a massa acaba por se lhes assemelhar.
- Deve ser isso.
- A partir deste ponto - continuei -, a sua paixão pelo ganho faz rápidos progressos e quanto mais estima têm pela riqueza menos a têm pela virtude. Com efeito, o que há de diferente entre a riqueza e a virtude não é que, colocadas uma e outra nos pratos de uma balança, tomam sempre uma direcção contrária?
- Sim, com certeza.