— Assim me parece — disse ele.
— Mas, Trasímaco, as artes governam e dominam o indivíduo sobre o qual se exercem.
só a muito custo concordou comigo neste ponto.
— Portanto, nenhuma ciência tem em vista nem prescreve a vantagem do mais forte, mas a do mais fraco, do súbdito governado por ela.
Também acabou por concordar comigo neste ponto, mas depois de ter tentado contestá-lo; quando cedeu, disse-lhe:
— Assim, o médico, na medida em que é médico, não tem em vista nem prescreve a sua própria vantagem, mas a do doente? Com efeito, reconhecemos que o médico, no sentido exacto da palavra, governa o corpo e não é homem de negócios. Não reconhecemos?
Concordou que sim.
— E o piloto, no sentido exacto, governa os marinheiros, mas não é marinheiro?
— Assim o reconhecemos.
— Por conseguinte, um tal piloto, um tal chefe, não terá em vista e não prescreverá a sua própria vantagem, mas a do marinheiro, do individuo que ele governa.
Concordou a custo.
— Deste modo, Trasímaco — prossegui —, nenhum chefe, seja qual for a natureza da sua autoridade, na medida em que é chefe, não se propõe e não ordena a sua própria vantagem, mas a do individuo que governa e para quem exerce a sua arte; é com vista ao que é vantajoso e conveniente para esse individuo que diz tudo o que diz e faz tudo o que faz.