Era, portanto, perfeitamente normal que tivesse sido convidado para a nossa pequena sessão; sentíamo-nos mesmo honrados com a sua presença.
Como disse, era baixo e robusto, sem nada de distinto na aparência; o largo rosto barbeado apenas tinha de notável dois grandes olhos de veludo castanho. Estava bem vestido, tinha modos de um cavalheiro e falava o inglês com um sotaque que fazia sorrir as senhoras. Mrs. Deacon, que não gostava das nossas pesquisas, abandonou o estúdio; tínhamos baixado a luz, como de costume, e aproximámos as cadeiras da mesa quadrada de acaju que estava no meio da sala. A iluminação era fraca, mas suficiente para que nos pudéssemos ver uns aos outros muito distintamente. Lembro-me de que até pude notar que o francês possuía mãos gorduchas com dedos quadrados.
- Como é divertido! - disse-nos ele. - Não me sentava desta maneira há numerosos anos e, no entanto, gosto muito disto. A senhora é médium? A senhora pratica o transe?
- Não completamente - respondeu Mrs. Delamere. Mas tenho sempre consciência de uma extrema sonolência.
- É o primeiro estádio. Basta encorajá-lo, e então sobrevém o transe. Quando chega o transe, então o seu pequeno espírito parte e um outro pequeno espírito chega para tomar o seu lugar; é assim que obtém a linguagem ou a escrita automática. Deixa a outro o cuidado de accionar a sua máquina. Hem? Mas que têm os licornes a ver connosco?
Harvey Deacon sobressaltou-se. O francês virara lentamente a cabeça e perscrutava as sombras que encobriam as paredes.
- Como é divertido! - murmurou. - Sempre licornes.
Quem pensou com tanta intensidade num tema tão bizarro? - É maravilhoso! - exclamou Deacon. - Durante todo o dia tentei pintar um. Como soube?
- Pensou nos licornes nesta sala?
- Certamente!
- Mas os pensamentos são coisas, meu amigo.
