«Esta membrana dá-lhes um aspecto viscoso, mas os olhos têm, além disso, uma acuidade inusitada de sageza, de força, de lassitude e de desespero. Talvez seja um puro efeito da minha imaginação, mas sinto-me vivamente impressionado. Por Jeová!, tenho de tornar a ver aqueles olhos de mais perto.»
Levantou-se, percorreu novamente as salas egípcias, mas o homem que assim excitara a sua curiosidade tinha desaparecido.
O estudante voltou a sentar-se no seu canto e recomeçou as pesquisas. Ao cabo de um momento, apenas lhe faltava transcrever para o caderno de apontamentos as informações recentemente colhidas. Mas a pouco e pouco a sua letra tornou-se menos regular, o lápis ficou mais lento e em breve caiu suavemente no chão ao mesmo tempo que a cabeça se inclinava pesadamente para diante. Cansado da viagem, adormeceu profundamente no seu canto solitário e não foi acordado nem pelos guardas que fecharam as portas, nem pelos passos dos guardas de noite, nem pelo barulho do grande sino, sinal da partida.
O crepúsculo transformou-se em obscuridade; o alarido da Rua de Rivoli diminuiu aos poucos, o relógio de Notre-Dame bateu ao longe as doze badaladas da meia-noite, e o nosso estudante continuava a dormir o sono dos justos! Todavia, perto da uma da manhã, os seus olhos abriram-se e Vansittart voltou a si; julgou-se por um instante em Londres, adormecido no seu escritório. Mas através das janelas sem persianas, o luar iluminava a sala com os seus raios prateados, e a vista das múmias alinhadas contra a parede refrescou-lhe a memória: recordou-se então claramente de onde se encontrava e como ali fora parar. Absolutamente destituído de nervosismo, possuía aquele amor pelas aventuras novas que é a característica da sua raça; esticando os membros entorpecidos, fixou o relógio e pôs-se a rir quando verificou a hora tardia.
