Antes de eu ter tempo para baixar a cabeça, a aparição tinha partido.
Voltei a cabeça para o lado da porta muito a tempo de ver um homem entrar na divisão com passos rápidos e furtivos.
Era um rapagão fortemente vigoroso, de tez muito tisnada, com pendentes nas orelhas e um lenço atado frouxamente à volta do pescoço.
A cabeça estava inclinada para o peito e todo o seu exterior era o de um homem afligido por um remorso intolerável.
Percorreu a sala de uma ponta à outra com passos rápidos como um tigre na jaula, e reparei que uma faca nua brilhava numa das suas mãos, ao mesmo tempo que mantinha fortemente apertada na outra uma coisa que me pareceu um pedaço de pergaminho.
- Sou um assassino, sou um bandido. Avanço a rastejar, avanço sem fazer nenhum barulho. Sei alguma coisa acerca do continente espanhol. Posso executar o truque do tesouro perdido. Tenho mapas. Sou robusto e bom caminhante. Capaz de assombrar um parque de grande extensão.
Deitou-me um olhar que pedia o meu consentimento, mas antes de eu poder fazer um sinal, fiquei paralisado pelo espectáculo horrível que apareceu à porta.
Era um homem de estatura muito elevada, se, ao menos, pode dar-se o nome de homem a uma criatura cujos ossos esbranquiçados perfuravam as carnes carcomidas e cujas feições tinham a cor do chumbo.
Trazia enrolado à sua volta com grandes pregas um sudário, e formava na cabeça uma touca, à sombra da qual brilhavam, como dois carvões vermelhos, os olhos, profundamente enterrados nas órbitas, aterradores.
O maxilar inferior pendia-lhe para o peito, deixando ver uma língua ressequida, enrugada, e duas fieiras de presas escurecidas e desalinhadas.
Estremeci e recuei ao ver esta aparição avançar para a borda do círculo:
- Sou o monstro americano que gela o sangue - disse ele numa voz que parecia subir num murmúrio cavernoso do solo onde se encontrava.