E falam-me de justiça só porque não admito que tenha pago este preço para que outro se aproveite do tesouro! Preferia ser enforcado várias vezes, ou levar com um dardo do Tanga, que viver numa cela de condenado e saber que outro homem está muito bem instalado num palácio com o dinheiro que devia ser meu.
Small deixara cair a sua máscara de estoicismo, e tudo isto saíra num violento turbilhão de palavras. Os seus olhos chamejavam, as algemas tilintavam com o movimento apaixonado das suas mãos. Consegui perceber, ao ver a fúria e a paixão do homem, como não era infundado ou pouco natural o terror que se apossara do major Sholto quando soube que aquele condenado andava atrás dele.
- Esquece-se que nada sabemos de tudo isso - disse Holmes tranquilamente. - Não ouvimos a sua história e não podemos dizer até que ponto a justiça estava originalmente do seu lado.
- Bem, o senhor falou-me muito sinceramente embora veja que tenho de lhe agradecer o facto de ter estas algemas nos pulsos. Mas não lhe guardo rancor. É tudo muito justo. Se quer ouvir a minha história não deixarei de a contar. Juro por Deus que o que lhe vou dizer é a verdade, cada palavra. Se fizer o favor, ponha o copo aqui ao meu lado, para eu beber quando tiver sede.
»Sou de Worcestershire, nasci perto de Pershore. Poderá encontrar aí muitos Smalls. Pensei muitas vezes ir até lá mas a verdade é que nunca fui muito bem-visto pela família e duvido que gostassem de me ver. Eram todos trabalhadores, gente que ia à igreja, pequenos agricultores, conhecidos e respeitados na região, enquanto eu sempre fui um bocado pirata. Por fim, quando tinha para aí dezoito anos, não lhes causei mais problemas, pois arranjei umas complicações com uma rapariga e só consegui safar-me alistando-me como soldado num regimento que ia partir para a Índia.