Gente de Dublin - Cap. 8: Capítulo 8 Pág. 72 / 117

Continuou a trabalhar afanosamente, mas, quando no relógio soaram cinco horas, ainda lhe faltavam catorze páginas. Que diabo!... Não conseguiria terminar aquilo a tempo. Estava tão encolerizado que se distraiu e escreveu Bernard Barnard em vez de Bernard Bodley e teve que recomeçar, encetando nova folha.

Sentia-se com forças suficientes para arrasar o escritório, só com uma das mãos. O seu corpo pedia-lhe qualquer acto de violência. Todas as indignidades da vida o assaltavam. Conseguiria ele que o caixa lhe desse um pequeno adiantamento?... Não, com o caixa nada conseguiria. Sabia onde havia de se encontrar com os amigos, Leonard, O'Hallorah e Nosey Flynn. O barómetro da sua natureza emocional apresentava-se tumultuoso. Estava tão distraído que não ouviu chamarem-no, por duas vezes. Mr. Alleyne e Miss Delacour encontravam-se junto ao balcão e os outros funcionários tinham parado o trabalho, pressentindo que qualquer coisa ia acontecer. Farrington ergueu-se. Mr.: Alleyne começou numa grande tirada, dizendo que faltavam duas cartas. Farrington respondeu que ignorava isso e fizera uma cópia fiel. Mr. Alleyne, no entanto, continuou com a sua tirada, e Farrington mal pôde conter o desejo de se atirar sobre aquele manequim que estava ali a gesticular.

- Nada sei a respeito dessas duas cartas...

- Não sabe nada... Pois é claro que não sabe de nada - disse Mr. Alleyne. - Diga-me - continuou ele voltando-se para a senhora que tinha a seu lado -, você toma-me por algum idiota?..

Farrington olhou para Miss Delacour e, depois, novamente para Mr. Alleyne. Antes que pudesse evitar disse:

- Eu não penso, senhor... Mas isso é de muito difícil resposta para mim...

Houve uma pausa. Todos estavam atónitos, inclusive Farrington. Miss Delacour, que era espertalhona, com eçou a sorrir. A fúria fez Mr. Alleyne ficar rubro, e com o punho cerrado na direcção da cara de Farrington, gritou:

- Você é um insolente!... Um impertinente rufião!... Havemos de ajustar contas!...

Ou pedirá desculpa pela sua inconveniência, ou deixará agora mesmo o escritório....

Farrington estava encostado a uma porta fronteiriça à do escritório, esperando a saída do caixa. Todos os funcionários foram passando, até que, finalmente, apareceu o caixa, acompanhado pelo chefe da secção. Nada adiantaria falar-lhe, enquanto estivesse com o outro. A sua posição já era suficientemente desagradável.





Os capítulos deste livro