Elias ouvia atónito aquelas palavras do velho camarada e não ousava dar-lhes crédito. Eram seguramente delírios da imaginação de um moribundo, e em sua incredulidade quase se envergonhava de toma-las ao sério.
- Pobre Simão!... - refletiu consigo, a razão já o vai abandonando com a vida!
Não podia conceber que à cabeceira de um miserável moribundo a fortuna e a felicidade o esperassem, como por vezes o infortúnio costumava-se ocultar entre as rosas de um festim para nos desfechar um golpe fatal e imprevisto. Todavia não pôde deixar de interromper o velho, e dirigir-lhe com ávida curiosidade esta pergunta:
- Uma lavra!... tu deliras, meu pobre Simão!... onde está ela?...
- Eu já lhe conto... ah! se Vmcê não aparecesse tão a tempo!... Vmcê está duvidando?... aqui está o que lhe há-de fazer acabar de crer... é o diamante, que eu já tinha tirado... isto é seu... se Vmcê não aparecesse, tudo isto ia parar nas mãos daquela malvada mulher, Deus me perdoe a mim e a ela!
Dizendo isto o velho, com a mão trémula e convulsa, ia tirando do pescoço um pequeno saquitel de couro preso a um cordão, em forma de bentinho, e o entregou nas mãos de Elias, dizendo-lhe:
- Corte e veja para acabar de crer, e não cuidar que já estou treslendo...
Elias puxou a faca que trazia presa à casa do colete, e cortou com cuidado o saquitel. Caiu-lhe na mão um punhado de grossos e lindos diamantes. Um lampejo de alegria raiou nos olhos empanados do moribundo que murmurou com voz surda:
- É seu; é tudo seu, patrão.
- Mas, Simão, disse Elias, não deixas no mundo filho, irmão, parente ou amigo, a quem queiras beneficiar?... posso eu aceitar isto sem prejuízo de ninguém?
- De ninguém, patrão, de ninguém.