Os Maias - Cap. 16: Capítulo 16 Pág. 528 / 630

Ela riu. E D. Maria da Cunha, nessa noite mais remoçada e viva, ficou logo toda banhada num sorriso, com aquela carinhosa admiração pelo Ega, que era um dos seus sentimentos.

- Este Ega!... Não há mal que lhe chegue!... E diga-me outra coisa, que é feito do seu amigo Maia?

Ega vira-a momentos antes, no salão, puxar pela manga de Carlos, cochichar com Carlos. Mas conservou um ar inocente:

-Está aí, anda por aí, assistindo a toda essa literatura.

De repente os olhos sempre bonitos e lânguidos de D. Maria da Cunha rebrilharam com uma faísca de malícia:

- Falai no mau... Neste caso seria falar do bom. Enfim aí nos vem o Príncipe Tenebroso!

E era com efeito Carlos que passava, se encontrara diante dos braços do conde de Gouvarinho, estendidos para ele com uma efusão em que parecia renascer o antigo afecto. Pela primeira vez Carlos via a condessa, desde a noite em que no Aterro, abandonando-a para sempre, fechara com ódio a portinhola da tipoia onde ela ficava chorando. Ambos baixaram os olhos, ao adiantar a mão um para o outro, lentamente. E foi ela que findou o embaraço, abrindo o seu grande leque de penas de avestruz:

- Que calor, não é verdade?

- Atroz! disse Carlos. Não vá V. Ex.ª apanhar ar dessa janela.

Ela forçou os lábios brancos a um sorriso:

- É conselho de médico?

- Oh, minha senhora, não são as horas da minha consulta! É apenas caridade de cristão.

Mas de repente a condessa chamou o Taveira, que ria, derretido, com a marquesa de Soutal, para o repreender por ele não ter aparecido terça-feira na rua de S. Marçal. Surpreendido com tanto interesse, tanta familiaridade, o Taveira, muito vermelho, balbuciou que nem sabia, fora o seu infortúnio, tinham-se metido umas coisas...

- Além disso não imaginei que V. Ex.ª começasse a receber tão cedo... V. Ex.ª antigamente era só depois da Cerração da Velha.

Até me lembro que o ano passado...

Mas emudeceu. O conde de Gouvarinho voltara-se, pousando a mão carinhosa no ombro de Carlos, desejando a sua impressão sobre o «nosso Rufino».





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