O Retrato de Dorian Gray - Cap. 19: Capítulo 19 Pág. 303 / 335

Só três dias depois é que se afoitou a sair. Havia no ar claro, embalsamado pelo aroma dos pinheiros, daquela manhã de Inverno, alguma coisa que parecia restituir-lhe a jovialidade e o ardor de viver. Não eram, porém, só as condições físicas do ambiente que motivaram a transformação. A sua própria natureza revoltara-se contra o excesso de angústia que procurara mutilar e estragar a perfeição da sua serenidade. É o que sempre sucede com os temperamentos subtis e requintados. As suas fortes paixões devem ou esmagá-los ou ceder. Ou matam o homem ou morrem. As dores superficiais, os amores superficiais continuam vivendo. A sua própria plenitude aniquila os grandes amores e as grandes dores. Convencera-se, além disso, de que havia sido vítima duma imaginação exaltada pelo terror, e encarava agora os seus passados receios com certo dó e não pequeno desprezo.

Depois do almoço passeou durante uma hora no jardim com a duquesa e depois atravessaram de carro o parque, a fim de se reunirem aos caçadores. A geada parecia haver polvilhado de sal a relva. O céu era como uma taça invertida de metal azul. Uma delgada película de gelo orlava a superfície lisa do lago. No recanto do pinhal avistou Sir Geoffrey Clouton, irmão da duquesa, que estava tirando da espingarda dois cartuchos já batidos.





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