Contos de Mistério - Cap. 2: O LOTE N° 249
(The lot n. 249) Pág. 29 / 167

Esta comunhão nas vigílias prolongadas formara entre eles uma espécie de laço secreto. Quando as horas fugiam para a madrugada, Smith gostava de sentir que, muito próximo, um outro estudante desprezava o sono tanto como ele. E neste preciso instante, quando os seus pensamentos se voltavam involuntariamente para o vizinho, apenas sentiu bons sentimentos. Hastie era um bom rapaz, mas írusto, excessivamente musculado, desprovido de imaginação e de compreensão. Não podia suportar um homem que não fosse talhado segundo o modelo viril que escolhera de uma vez por todas. Se alguém não podia ser avaliado conforme estas normas, atraía infalivelmente a antipatia de Hastie. Como tantos rapazes que são fisicamente robustos, ele confundia de bom grado a constituição com o carácter, não hesitava em atribuir a uma falta de princípios o que não passava de um defeito de circulação. Smith tinha o espírito mais solto: conhecia a mania do camarada e levava isto em conta.

Como este ruído estranho não se tinha repetido, Smith estava prestes a voltar a pegar no livro, quando de súbito um queixume rouco, um verdadeiro grito furou o silêncio da noite. Era o apelo de um homem que é excitado, sacudido para lá de qualquer controlo. Smith saltou do cadeirão e largou o livro. Apesar dos seus nervos sólidos, aquele brusco grito de horror tinha-lhe gelado o sangue e arrepiado a pele. Emitido num tal lugar e a uma hora daquelas, engendrou na sua cabeça mil hipóteses fantásticas. Devia ir a correr lá a baixo ou ficar à espera? Detestava, como todos os seus compatriotas, dar-se em espectáculo ou impor-se, e sabia tão poucas coisas acerca do seu vizinho que não lhe interessava imiscuir-se com ligeireza nos

seus assuntos. Hesitou durante alguns momentos, mas fizeram-se ouvir passos rápidos na escada, e o jovem Monkhouse Lee, semivestido e branco como um lençol, surgiu no seu quarto.





Os capítulos deste livro