O Garimpeiro - Cap. 15: XV – ABNEGAÇÃO Pág. 123 / 147

Que importa!... estou certo que em cada negociante que matar mandarei para o inferno a alma de um ladrão, e é lá o seu lugar. É um crime! ? não... pelo menos a consciência não me remorde... Não serei mais do que o agente da justiça do céu sobre a terra, já que nela não há nem sombra de justiça. Infames!... não contentes de enriquecerem-se à custa do suor e das lágrimas dos pobres, ainda querem lhes roubar a felicidade, e julgam-se com direito a isso, porque sabem absorver o fruto do trabalho dos outros! Oh! por Deus, ou pelo diabo, que não há-de ser assim!... Este mundo!... este mundo é o inferno dos bons e o paraíso dos malvados... E portanto o remédio é ou livrar-se dele para sempre, ou alistar-me no número dos malvados... Mas... que estou eu a dizer!... eu endoideço!... Lúcia! minha Lúcia! é pois verdade que devo perder-te!... perder-te para sempre? !...

Este estado de exaltação, que quase tocava ao delírio, durou por largo tempo, até que veio a fadiga e a prostração. Por fim atirou-se na cama que tinha ali mesmo na pequena sala; já a noite ia adiantada, e graças ao torpor do cansaço dormiu algumas horas. Com esse repouso acalmou-se um pouco a irritação de seu espírito. Quando acordou, já os galos cantavam.

Levantou-se, abriu a janela para refrescar a cabeça abraseada ao sopro das brisas da madrugada. Ainda não era dia. Debruçou-se sobre o peitoril e depois de estar a cismar largo tempo com a cabeça embebida entre as mãos, murmurou consigo:

- Está decidido!... minha vida tem de ser sempre uma série de provações e martírio. É essa a vontade do céu, e é escusado lutar contra o destino. Portanto ou devo-me desfazer dela desde já, ou resignar-me à minha sorte. O meu dever de cristão é curvar-me e aceitar cheio de resignação o cálix da amargura.





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